RESUMO:A sociologia da infância propõe-se a constituir a infância como objecto sociológico, resgatando-a das perspectivas biologistas, que a reduzem a um estado intermédio de maturação e desenvolvimento humano, e psicologizantes, que tendem a interpretar as crianças como indivíduos que se desenvolvem independentemente da construção social das suas condições de existência e das representações e imagens historicamente construídas sobre e para eles. Porém, mais do que isso, a sociologia da infância propõe-se a interrogar a sociedade a partir de um ponto de vista que toma as crianças como objecto de investigação sociológica por direito próprio, fazendo acrescer o conhecimento, não apenas sobre infância, mas sobre o conjunto da sociedade globalmente considerada. A infância é concebida como uma categoria social do tipo geracional por meio da qual se revelam as possibilidades e os constrangimentos da estrutura social. O desafio a que nos propomos é interrogar o modo como constructos teóricos como "geração" e "alteridade" se constituem como portas de entrada para o desvelamento dos jardins ocultos em que as crianças foram encerradas pelas teorias tradicionais sobre a infância e de como esse conhecimento se pode instituir em novos modos de construção de uma reflexividade sobre a condição de existência e os trajectos de vida na actual situação da modernidade. Palavras
A infância, como construção social, tem sofrido, no decurso da 2ª modernidade, processos de reinstitucionalização que, em larga medida, põem em causa as representações e imagens das crianças, dominantes nos últimos 200 anos. A análise da (re)construção das identidades sociais e das subjectividades infantis constitui, desse modo, uma tarefa teórica da mais exigente actualidade. O que, entretanto, aqui se assinala é que este processo de reinstitucionalização da infância, apesar da construção de consensos globais sobre os direitos das crianças, tem vindo a aumentar os factores e as condições de exclusão das gerações mais jovens face aos direitos sociais e da cidadania. Neste artigo inventariam-se alguns dos principais indicadores de exclusão, considerando diversos espaços estruturais, e assinalam-se alguns dos pontos de ruptura por onde pode passar a construção de uma educação escolar centrada na afirmação activa dos direitos das crianças.
A participação infantil assume-se na segunda modernidade como um princípio incontornável em grande parte dos discursos científicos que são produzidos acerca da infância. A Sociologia da Infância, ao considerar as crianças como actores sociais e como sujeitos de direitos, assume a questão da participação das crianças como central na definição de um estatuto social da infância e na caracterização do seu campo científico. Considerar a participação das crianças na investigação é um passo decorrente da construção de uma disciplina das ciências sociais que procura “ouvir a voz das crianças”, isto é, que assume que as crianças são actores sociais plenos, competentes na formulação de interpretações sobre os seus mundos de vida e reveladores das realidades sociais onde se inserem. As metodologias participativas com crianças atribuem aos mais jovens o estatuto de sujeitos de conhecimento, e não de simples objecto, instituindo formas colaborativas de construção do conhecimento nas ciências sociais, que se articulam com modos de produção do saber empenhadas na transformação social e na extensão dos direitos sociais. A investigação participativa com crianças levanta, no entanto especiais dificuldades epistemológicas, relacionadas quer com a alteridade da infância quer com a diversidade das suas condições de existência. O entendimento da “criança” como o outro do adulto decorre do reconhecimento das culturas da infância como modo específico, geracionalmente construído, de interpretação e de representação do mundo. É o trabalho de tradução entre a linguagem das ciências sociais e a linguagem das crianças (com as suas gramáticas culturais distintas) que as metodologias participativas são chamadas a desempenhar, com a consequente recusa do etnocentrismo geracional e com a indispensável mobilização de um discurso polifónico, onde a voz das crianças-investigadoras colaborativas perpassa lado a lado com o trabalho interpretativo dos sociólogos da infância. A atenção à diversidade da infância, decorrente de categorias sociais como o género, a religião, a etnia, a saúde e o (sub)grupo etário, impõe a recusa de olhares uniformizadores, desafiando a imaginação metodológica a uma aceitação e respeito pelas diferenças e pelos diversos modos da sua comunicação. Assente em trabalhos de investigação em Sociologia da Infância construídos com metodologias participativas, esta comunicação interroga a construção do conhecimento em ciências sociais com e sobre as crianças e a infância, atendendo à alteridade e diversidade, e incluindo o debate ético sobre a produção de saber sobre os mundos sociais da infância.
A maior parte das crianças do mundo vive em cidades. Estas, cada vez mais marcadas por fenômenos de superpopulação, congestionamento de tráfego, aumento de indicadores de poluição, de insalubridade e de risco. E a população urbana não tem parado de aumentar. Porém, não são apenas esses os fatores que influenciam a vida das crianças na cidade. Como a investigação sociológica da infância tem vindo a assinalar, a vida das crianças exprime a complexidade das realidades sociais contemporâneas, podendo associar-se aos contextos urbanos, tanto fatores de restrição da cidadania da infância quanto fatores de possibilidade. A partir da caraterização desses fatores, procura-se, neste texto, fundamentar políticas públicas que potenciam o bem-estar das crianças e a afirmação dos seus direitos em contexto urbano.
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