Resumo: Nas últimas décadas, as teorias neurocientíficas passaram a ser adotadas como explicação primordial para a etiologia dos transtornos mentais. Com o objetivo de encontrar os fundamentos dos transtornos, as investigações priorizaram a carga genética e o funcionamento cerebral. A partir da valorização da determinação biológica das doenças e do surgimento de variadas tecnologias de pesquisa médica, aventou-se a possibilidade de que as causas dos transtornos fossem, finalmente, compreendidas. No entanto, diversas dificuldades e desafios marcam o projeto neurocientífico de fundamentação biológica da etiologia das doenças. A introdução recente da noção de epigenética no campo psiquiátrico vem sendo considerada fundamental para renovar a esperança de compreensão da etiologia dos transtornos. A partir da análise de artigos de revisão, o presente trabalho tem como objetivos examinar a apropriação da noção de epigenética pelo campo psiquiátrico contemporâneo, identificando suas origens e descrevendo suas principais características, e refletir sobre as consequências de sua adoção. Além de contribuir para a redefinição das teses etiológicas no campo psiquiátrico, a noção de epigenética impõe uma reconfiguração do conhecimento genético e, em certa medida, do próprio projeto determinista e reducionista de fundamentação biológica dos transtornos mentais, permitindo interpretações mais nuançadas sobre as neurociências e a psiquiatria contemporânea. Palavras-chave: Psiquiatria biológica; neurociências; etiologia.