Trajetória de pesquisa e tensões éticas: entre persistências e resistências

Abstract

O artigo problematiza o tema da ética em pesquisa, buscando dialogar com o debate contemporâneo acerca das relações entre o Sistema CEP/Conep e as Ciências Humanas e Sociais. O fio condutor da reflexão é dado pelas investigações realizadas e narradas como trajetória de pesquisa, enfatizando a reflexividade das práticas antropológicas. As tensões éticas são pontuadas através das condições de negociação da pesquisa e das interações entre pesquisador-participantes e hierarquias em contextos de pesquisa. Inicialmente, pontuo pesquisas quando a regulamentação não tinha ascendência sobre o domínio das CHS, o que não significa a ausência de reflexão ética. Em seguida, anuncio a inversão nas hierarquias das relações em pesquisa a partir do diálogo sobre risco realizado com cientistas/pesquisadores cuja posição social remetia às relações entre campos disciplinares. Enfim, trago a experiência recente sobre o parecer recebido do CEP/Conep para investigação e o processo de “colonização” da investigação pela via da burocratização do projeto de pesquisa

“Tudo bonitinho”: Pensando ética na prática e pelo avesso nas pesquisas sobre o Vírus Zika no Recife/PE

“…Não quero parecer estar num ponto áureo de enunciação ética, com o risco de me tornar justamente o ser prescritivo que tantas vezes critico. É bom lembrar que ética é uma linguagem amplamente familiar para universidades e equipes de pesquisadores (Neves 2018), ao ponto de ter virado o critério moral da boa pesquisa (Macedo 2018). Embora seja fundamental que reflitamos sobre os procedimentos que usaremos em nossas pesquisas, que busquemos não gerar danos às pessoas com quem estudamos (sejam os sujeitos pesquisados, sejam os sujeitos pesquisadores), não gostaria que o empreendimento científico se tornasse impermeável às sugestões e críticas que possam derivar dos imponderáveis e das tensões éticas que eventualmente surgirem durante a sua realização (Neves 2018).…”

“…É bom lembrar que ética é uma linguagem amplamente familiar para universidades e equipes de pesquisadores (Neves 2018), ao ponto de ter virado o critério moral da boa pesquisa (Macedo 2018). Embora seja fundamental que reflitamos sobre os procedimentos que usaremos em nossas pesquisas, que busquemos não gerar danos às pessoas com quem estudamos (sejam os sujeitos pesquisados, sejam os sujeitos pesquisadores), não gostaria que o empreendimento científico se tornasse impermeável às sugestões e críticas que possam derivar dos imponderáveis e das tensões éticas que eventualmente surgirem durante a sua realização (Neves 2018). Os desencontros e as tensões não são, necessariamente, frutos de má fé e nem inviabilizam por completo o projeto de pesquisa, mas podem ser aproveitados para rever o rumo.…”

“…Em vez de seguirmos uma cartilha top-bottom das resoluções e normativas da ética científica, as interlocutoras que conhecemos no Recife sugeriram que ética deveria ser composta pelos termos negociados entre as partes para, só assim, acontecer a relação que embalará cada encontro. Se alguns colegas foram conhecer esses termos a partir dos relatos feitos por outras pesquisadoras (Schuch & Victora 2015) ou pelas suas próprias experiências enquanto pesquisadoras (Macedo 2017;Neves 2018), aqui, como já fizeram antes de mim (Silva 2000;Castro 2018), quero conhecer como os sujeitos pesquisados pensam os termos, as negociações, as relações e encontros que tiveram com cientistas e, quando não respeitados, como perceberam as 'tensões éticas'.…”