A contribuição da crítica feminista à naturalização das diferenças entre homens e mulheres, antes compreendidas como uma diferenciação genética e não como resultado de um processo de construção das desigualdades, provocou uma significativa reestruturação da tradição do pensamento vigente. O gênero transformou-se numa categoria de grande valor heurístico, seja na desconstrução dessa tradição tida como "cega ao gênero", seja na reconstrução teórica a partir do enfoque nas "experiências concretas das mulheres nas culturas, na sociedade e na história" (Seyla BENHABIB; Druscilla CORNELL, 1987, p. 7).Uma das principais críticas partilhadas pelas feministas à época era da manutenção de uma ciência a serviço dos dominantes que se justificava pelas noções de objetividade, racionalidade e universalidade do saber científico, como salienta Ilana Löwy: apresentar os conhecimentos produzidos num dado momento -desde aurora do período moderno -, num dado local (Europa, e mais tarde a América do Norte), por indivíduos dotados por uma identidade social específi ca (machos, membros das classes dominantes) como o único saber, objetivo universalmente válido, de modo a excluir qualquer outro ponto de vista (o das mulheres, dos pobres, das pessoas "de cor", de países não ocidentais) possibilitou que se consolidasse a hegemonia material e ideológica dos dominantes (LÖWY, 2009, p. 42).