Alternatividades Em Saúde Humana E a Geografia Da Saúde

Abstract

A história que fundamenta os cuidados e práticas em saúde humana é marcada por um misto de práticas/teorias mágicas e experimentos científicos, e evidencia, desde a Antiguidade, princípios empíricos. A medicina, uma destas práticas, limitava-se aos membros das classes mais altas e detentores de poder, assim como os tratamentos. Contudo, uma outra racionalidade era operacionalizada pelas classes mais baixas. Eram atores, detentores de saberes e práticas alternativas, ao modelo oficial, que contribuíam prestando atendimentos as populações sem acesso à medicina oficial. Diante desses expostos o trabalho visa discutir em um primeiro momento as concepções díspares para a saúde existentes em nossa sociedade (racionalidade científica pós-moderna e o modelo das alternatividades em saúde). Em um segundo momento, discute-se as alternatividades em saúde humana dentro da área da Geografia da Saúde, com a legitimação de sujeitos, dos sistemas médicos complexos e terapêuticas tradicionais e complementares. Com isso, será realizada uma análise do estado da arte das perspectivas alternatividades em saúde a partir dos artigos da Revista Brasileira de Geografia Médica e da Saúde – Hygeia, desde seu lançamento, em 2005, até junho de 2020. Objetiva-se depreender quais são as discussões e vertentes teóricas/metodológicas em voga, e o lugar das alternatividades ao longo dos 15 anos. Como considerações, revela-se a necessidade da discussão das alternatividades dentro da Geografia da Saúde, fundamental à legitimação das práticas e sujeitos alocados dentro das, não oficiais, alternatividades a saúde, assim como, para a construção de uma outra epistemologia da saúde.

Saberes De Cura E De Saúde No Âmbito Da Geografia: Herança Colonial No Brasil

“…Diante deste cenário, faz-se importante ressaltar que, "Quando a medicina alternativa não é praticada com os devidos preceitos, presentes na gênese dos povos tradicionais, [...] acontece uma apropriação cultural e deslegitimação dos sujeitos [...]" (Dias;Mendonça, 2020, p. 274), na qual, segundo os autores, pode ampliar-se para uma atividade criminosa. Porém, no período da colonização, os estrangeiros eram considerados 'superiores' aos povos nativos, fato que permitiu e legitimou essa 'apropriação' do saber ancestral.…”

“…Na Geografia da Saúde, tais saberes são bem expressivos, "[...] pois essa se encarrega de determinar quais causas e fenômenos aliados aos espaços e microespaços são fatores que contribuem ou prejudicam a saúde das populações e de seus lugares" (Dias;Mendonça, 2020, p. 274). Os autores se debruçaram ao estudo de um 'Modelo das Alternatividades em Saúde Humana', apontando outra racionalidade operacionalizada pela classe mais baixa, em detrimento das teorias construídas (modelo eurocêntrico) para o processo saúde-doença, que se limitavam as classes mais altas.…”

“…"No Brasil, os estudos de saúde sob a perspectiva do saber geográfico estiveram quase sempre a serviço de interesses colonialistas ou desenvolvimentistas de base capitalista" (Silva, 2018, p. 82). No entanto, esse conhecimento não se restringiu aos estudiosos da elite, estendendo aos sujeitos e saberes alternativos (Dias et al, 2020).…”

Desigualdades em saúde, desigualdades no território: desafios para os países de língua portuguesa em contexto de pós pandemia

“…Posto isso, é necessário situá-las junto de suas comunidades, buscando revelar a sua socioespacialidade, pois as benzedeiras são frequentemente mulheres, negras e moradoras da periferia urbana ou rural, características estas que tem o potencial de identificar mais a fundo as questões sociais, religiosas e espaciais que permeiam a atividade do benzimento e lhe aderem a sua importância comunitária. Estabelecer estas bases para a compreensão do bem-estar e da saúde torna-se ainda mais importante ao se tratar de alternativas de tratamento além da medicina tradicional buscadas pelas pessoas ou populações (Dias & Mendonça, 2020;Mendonça, 2019). Sobretudo no contexto das benzedeiras que, como nos apresenta Oliveira (1985a), tratam-se de problemas concretos, pessoais, familiares ou de terceiros da população, que se expressam sobretudo através de relações fisiológicas, sociais ou religiosas, e são produzidos no seio de uma sociedade desigual, onde ocorre a oferta de opções desiguais de cura para diferentes pessoas e classes sociais.…”

Conhecimentos tradicionais como medicina popular de cuidado com a saúde em uma comunidade ribeirinha do interior da Amazônia

“…Assim, desde a Antiguidade Clássica a medicina é destinada a grupos seletos da sociedade, colocando-a como um conhecimento de elite, prospectando a desvalorização de outros sujeitos e saberes que possuem fundamentações históricas tão antigas quanto a da própria medicina científica. O início da medicina segue um misto de mística e experimentos científicos, e evidencia, desde então, fundamentos na empiria (Dias & Mendonça, 2020). Luz (1998) entende que "medicinas alternativas" é uma etiqueta institucional designada para qualquer forma de medicina e cura que não sejam propriamente biomédicas.…”