Características dos adolescentes ofensores sexuais e de suas vítimas: um estudo de processos judiciais

Abstract

Resumo A violência sexual praticada por adolescentes ainda é pouco estudada no Brasil. Conhecer esses sujeitos é fundamental para a compreensão do fenômeno e execução de ações preventivas. Este artigo apresenta características dos adolescentes ofensores sexuais, bem como de suas vítimas e do contexto da violência. Para isso, foram analisados 254 processos judiciais, entre 2013 e 2016, no Distrito Federal, envolvendo 285 ofensores e 291 vítimas. A partir das informações coletadas, elaborou-se um quadro descritivo, cuja análise foi realizada de forma contextualizada e tendo como referência outros importantes estudos na área. Os resultados apontaram a diversidade dos adolescentes ofensores sexuais, porém as informações sobre as famílias foram bastante escassas nos processos. Quanto à idade e à escolaridade, a maior parte cometeu a ofensa com 16/17 anos (41,4%) e cursava o ensino fundamental II (29,5%). Um número significativo de adolescentes tinha envolvimento anterior com a justiça (24,2%). Os abusos foram prioritariamente extrafamiliares (48,5%), com vítimas do sexo feminino (67,7%), entre 10 e 14 anos (40,5%) e conhecidas do ofensor (92,2%). Ressalta-se a complexidade dos casos, impossibilitando intervenções padronizadas e descontextualizadas, assim como a importância de conhecer o contexto social e as relações familiares desses sujeitos com vistas a intervenções mais assertivas.

Atendimento psicossocial grupal a adolescentes que cometeram ofensa sexual

“…Também, devido às condições do contexto familiar e social, por exemplo com falta de diálogo e suporte dos cuidadores responsáveis, ausência de orientação e educação adequada à idade e presença de vulnerabilidades sociais (Andolfi & Mascellani, 2014;Borges & Costa, 2023;Bastos & Costa, 2020;Tavares, Setubal, Montenegro, Moreira, & Costa, 2020;Yoder et al, 2019). Compreende-se que a ofensa sexual é um tema interacional e complexo que tende a permanecer encoberto, sobretudo quando ocorre no âmbito intrafamiliar e, especialmente, se é cometido pelo adolescente, irmão, primo, tio ou parente próximo (Borges & Costa, 2020;Bastos, Eusébio, Pereira, Silva, & Costa, 2021;Debona, Teixeira, Lima, Neto, & Gontijo, 2018). Assim, urge que se compreenda a ofensa como um circuito no qual o autor deva ser incluído no atendimento (Blackley & Bartels, 2018;Costa et al, 2020a;Kettrey & Lipsey, 2018;Seto, Babchishin, Pullman, & McPhail, 2015).…”

Jovens autores de agressão sexual: fatores de risco e experiências adversas

“…A agressão sexual é um fenômeno que historicamente atravessa a humanidade de forma complexa, cuja manifestação carrega traços do período atual e do contexto social em que ocorre (Muller, 2006;Reis, 2016). Nesse cenário, a violência sexual está presente em diferentes sociedades e culturas, o que destaca uma dissociação em relação à condição socioeconômica, etnia ou religião (Bastos, Eusébio, Pereira, Silva, & Costa., 2021;Hohendorff , Habigzang, & Koller, 2012;Pires Filho, 2011).…”

“…Em relação ao tema abordado, torna-se necessário pontuar alguns conceitos importantes. A violência sexual é caracterizada como todo ato sexual, ou tentativa, cometido por um adulto ou adolescente, que se favoreça da sexualidade da vítima por meio da coerção, sem a necessária inclusão de contato físico (Bastos et al, 2021;Organização Mundial da Saúde, 2002). Acerca de suas tipologias, a legislação brasileira, a partir da Lei 12.015 (2009), define estupro como como o ato de "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso" (Brasil, 2009).…”

“…Após um levantamento bibliográfico acerca dos estudos cuja análise envolve o autor da violência sexual, em específico dos últimos doze anos, observa-se uma carência na literatura ainda maior no que se refere a figura do jovem autor de agressão no Brasil (Bastos & Costa, 2022;Bastos et al, 2021). Além da lacuna presente nas pesquisas com a população, os dados acerca do quantitativo de adolescentes autores de agressão sexual são de difícil acesso, resultando na subnotificação dos casos dessa tipologia de violência (Bastos & Costa, 2022;Ipea, 2023).…”

“…Além da lacuna presente nas pesquisas com a população, os dados acerca do quantitativo de adolescentes autores de agressão sexual são de difícil acesso, resultando na subnotificação dos casos dessa tipologia de violência (Bastos & Costa, 2022;Ipea, 2023). No entanto, as pesquisas já realizadas com jovens autores dessa forma de violência apontam para variações nesse perfil: Sem vínculo de parentesco com a vítima, a qual geralmente é adolescente ou adulta, com índice de reincidência menor em relação ao adulto e em situação de vulnerabilidade socioeconômica (Barroso, 2012;Bastos et al, 2021). Tais autores retratam o grupo de jovens autores como heterogêneos em comparação aos adultos, sendo essas evidências consideradas consistentes até o momento atual.…”