Introdução: Os médicos de família e comunidade, até pouco tempo atrás restritos ao Sistema Único de Saúde, têm sido cada vez mais requisitados no sistema suplementar. As experiências como profissionais ligados à assistência e como gestores das operadoras de saúde têm levado alguns a buscar empreender por meio de negócios próprios, na forma de clínicas e consultórios. Há um conjunto de competências que caracteriza o comportamento empreendedor, chamadas na literatura de competências comportamentais empreendedoras. Objetivo: Entender como essas competências comportamentais empreendedoras estão presentes nos médicos de família e comunidade pioneiros, seu perfil demográfico e socioeconômico, e quais influências pregressas encorajaram o aceitamento do risco para investir. Metodologia: Estudo misto, com desenho qualiquantitativo e exploratório-descritivo, com médicos de família e comunidade que já possuem consultório próprio. Foi aplicado o instrumento criado por Lenzi para a quantificação das competências comportamentais empreendedoras individuais e outro com questões para a caracterização sociodemográfica e contextual da amostra. Resultados: Foram convidados 16 médicos de família e comunidade empreendedores e atuantes no território brasileiro, encontrados por meio de contato em grupos da especialidade ativos em redes sociais. Apenas 11 responderam a ambos os questionários: seis homens e cinco mulheres de oito cidades diferentes, a maior parte capitais com mais de 1 milhão de habitantes, 90,9% formados em universidades públicas, 63,6% entre 30 e 40 anos, todos com experiência pregressa no Sistema Único de Saúde. A maior parte dos negócios tem menos de um ano (45,5%), rende menos de R$ 5.000,00 ao mês (45,5%), e a maior parte dos entrevistados trabalha ainda em outros serviços, como o próprio Sistema Único de Saúde ou para operadoras de saúde (90,9%). As competências comportamentais empreendedoras mais presentes foram “comprometimento” (90,9%), “busca de informações” (81,8%), “persistência” (72,7%) e “correr riscos calculados” (72,7%). As menos presentes foram “independência e autoconfiança” (27,3%) e “estabelecimento de metas” (45,4%). Conclusões: Apesar de ser por conveniência, é possível que a amostra represente significativa parcela dos poucos médicos de família que se têm arriscado no competitivo mercado do setor privado em saúde. Suas características: jovens, com gênero equilibrado, longa experiência no Sistema Único de Saúde e início recente no mercado privado, ainda com muito receio de investir e pouca formação formal no ramo do empreendedorismo. Este provavelmente é um retrato fidedigno do momento atual. O perfil das competências comportamentais empreendedoras desenvolvidas corroborou a literatura e serviu para alertar sobre a falta de foco no planejamento, mostrando que, embora trazer a médicos de família e comunidade para o mercado privado seja uma ideia inovadora, só boas ideias não são suficientes para produzir a estabilidade e sustentabilidade dos negócios.