“…A releitura da poesia, em alternância, em sequência e até em colagem com a leitura dos jornais e de The God of the labyrinth, assume uma função estruturante da narrativa, lembrando o procedimento análogo de Visconti de fazer da música de Mahler uma "organizing narrative force" (BURROWS, 2000), também capaz de revelar aquela atitude impassível do artista perante a realidade que se tornará central na recriação saramaguiana de Ricardo Reis: num episódio ausente na novela de Mann, Morte a Venezia mostra como o compositor, sentado no banco da estação dos barcos e dissimuladamente satisfeito por ter um pretexto para regressar junto do seu amado Tadzio, só por um breve momento se deixa perturbar pela morte de um homem pobre, vítima da epidemia, agonizando diante dos seus olhos [V 25]. Já um dos primeiros críticos, Joan Mellen observou que este comportamento corresponde à "hypocrisy of those self-absorbed middle-class travelers who ignore the suffering of others" (MELLEN, 1971, p. 45).…”