Yersinia enterocolitica é um patógeno associado usualmente a produtos derivados de suínos, seu principal reservatório. Esse patógeno é frequentemente isolado em tecidos linfáticos de suínos, em especial tonsilas palatinas e linfonodos mesentéricos. Por estar intimamente associada a cadeia produtiva de suínos, Y. enterocolitica está sujeita a todos os efeitos derivados dos procedimentos de manejo usualmente aplicados aos animais, como o desenvolvimento de resistência devido a aplicação preventiva ou terapêutica de antibióticos. Em um estudo prévio de nosso grupo, Y. enterocolitica foi identificada em uma cadeia produtiva de suínos e os isolados apresentaram alta similaridade de seus perfis de macro-restrição por XbaI. Assim, esse estudo teve como objetivo avaliar a persistência de Y. enterocolitica nessa cadeia produtiva de suínos, além de verificar a similaridade e potencial clonalidade dos isolados do bio-sorotipo 4/O:3 com isolados obtidos de casos de yersiniose humana, além de seus perfis de resistência a antibióticos. Amostras de tonsilas palatinas (n = 100), palatos (n = 30) e carne de cabeça (n = 17) foram obtidas durante o abate de suínos provenientes da mesma cadeia produtiva de suínos em que o estudo prévio de nosso grupo foi conduzido; as amostras foram submetidas a pesquisa de Y. enterocolitica, e os isolados obtidos submetidos a identificação de seus bio-sorotipos, pesquisa de genes de virulência (ail, ystB, virF, myfA, ystA, ystC, fepA, fepD, fes, tccC, ymoA, hreP e sat) e resistência múltipla a antibióticos (emrD, yfhD e marC). Parte desses isolados (n = 24) e isolados obtidos no estudo anterior de nosso grupo (n = 13) foram selecionados e caracterizados quanto aos seus perfis de macro-restrição com XbaI e NotI. Entre as amostras analisadas, 14 (9,5%) foram positivas para Y. enterocolitica, e os isolados obtidos (n = 24) foram identificados como pertencentes ao bio-sorotipo 4/O:3. Todos os isolados apresentaram resultados positivos para os genes de virulência e resistência múltipla a antibióticos pesquisados. Os isolados selecionados apresentaram alta similaridade após análise de seus perfis de macro-restrição, sendo agrupados em dois clusters com 33 (similaridade entre 82,4 e 100,0%) e 4 (similaridade entre 83,3 e 100,0%) isolados. Em seguida, parte desses isolados (n = 24) e isolados de Y. enterocolitica 4/O:3 obtidos de casos de yersiniose humana (n = 3) foram submetidos a sequenciamento completo de seus genomas e análises de similaridade, além de serem caracterizados quanto aos seus perfis de resistência a antibióticos pelo método de difusão em disco (14 antibióticos). Pela análise de polimorfismo de nucleotídeo único (SNP), os isolados foram agrupados em dois grandes clados, sendo apenas um isolado (R31) no Clado A e os demais no Clado B, e um total de sete grupos clonais. As diferenças marcantes observadas no genoma do isolado R31 foram determinadas pela presença de vários genes associados a fagos, o que determinou a sua identificação como pertencente ao sorotipo O:5. Treze isolados apresentaram resistência a antibióticos de três ou mais classes, sendo caracterizados como multidroga resistentes. A análise dos genomas dos isolados permitiu a identificação de 17 genes associados a resistência a antibióticos. A maioria dos isolados apresentou resistência a cefalosporinas, porém sem a presença de genes correspondentes a esse grupo de antibiótico. O estudo permitiu identificar a persistência de Y. enterocolitica do bio-sorotipo 4/O:3 na cadeia produtiva de suínos analisada, além de uma alta similaridade genética entre isolados obtidos nessa cadeia produtiva com isolados obtidos de casos de yersiniose humana, confirmando a relevância de suínos na manutenção e transmissão desse patógeno.