A talassemia alfa constitui um grupo de doenças hereditárias, de distribuição mundial, causada pela deficiência de síntese de uma ou mais cadeias alfa da hemoglobina.A primeira descrição clínica de talassemia alfa ocorreu em meados da década de 1950, quando Rigas (EUA) e Gouttas (Grécia), analisando indivíduos com quadro laboratorial sugestivo de talassemia beta, sobretudo pela presença de microcitose e hipocromia, observaram que alguns apresentavam concentrações normais das hemoglobinas A 2 e fetal, associadas à presença de quantidades variáveis de uma hemoglobina de migração mais rápida que a hemoglobina A, que, posteriormente, foi denominada hemoglobina H (Hb H) e corresponde ao tetrâmero de globinas beta normais. 1 Com o desenvolvimento das técnicas de biologia molecular, a partir da década de 1970, a estrutura genética e molecular, bem como a localização e organização dos genes alfa foram elucidadas. Demonstrou-se que, em indivíduos normais, as células diplóides contêm quatro genes codificantes para as cadeias alfa (α) da hemoglobina (α 2 α 1 /α 2 α 1 ), presentes no cromossomo 16 (dois em cada cromossomo 16). As diferentes formas de talassemia alfa estão relacionadas à deficiência, na maioria das vezes, devido à deleção, de um, dois, três ou dos quatro genes alfa. Quando apenas um gene alfa está inativado denomina-se talassemia α + e quando os dois genes estão afetados designa-se talassemia α 0 . 1,2 Do ponto de vista clínico, existem três formas de talassemia alfa: traço talassêmico α (deleção de um ou dois genes α), doença da Hb H (três genes α afetados) e síndrome da hidropsia fetal (quatro genes α afetados). 1,2 O traço talassêmico α + heterozigoto (-α/αα), também denominado portador silencioso, resulta em uma forma de talassemia praticamente assintomática e com alterações laboratoriais mínimas ou ausentes, o que dificulta o seu diagnós-tico por técnicas laboratoriais convencionais.O traço talassêmico α + homozigoto e o traço talassêmico α 0 heterozigoto, que correspondem à perda de dois genes alfa, ou seja, -α/-α e --/αα, respectivamente, caracterizam-se por apresentarem anemia (Hb geralmente entre 11,0 e 13,0 g/dl), hemácias hipocrômicas e microcíticas (VCM entre 75 e 80 fl), anisopoiquilocitose discreta e pela presença de Hb Bart's (5% a 10%) ao nascimento. A Hb H formada na vida adulta é rapidamente proteolisada pela própria hemácia, o que dificulta a sua detecção.A interação das formas α 0 e α + (--/-α) resulta na doença da Hb H. Os pacientes portadores dessa forma apresentam 25% a 50% de Hb Bart's ao nascimento e 5% a 30% de Hb H na vida adulta. Os quadros clínico e laboratorial são mais exuberantes e caracterizam-se por anemia (Hb entre 8,0 e 11,0 g/dl), microcitose (VCM entre 55 e 65 fl), hipocromia e poiquilocitose, presença de hemácias policromatófilas e de hemácias em alvo, icterícia e esplenomegalia.A homozigose da talassemia α 0 (--/--), denominada hidropsia fetal, é a forma mais grave das síndromes talassêmicas, sendo causa de morte intra-uterina ou morte logo após o nascimento. Nesses ca...