ResumoA lateralidade humana tem sido concebida como sendo predominantemente o resultado de fatores filogenéticos do desenvolvimento humano, enquanto que apenas importância secundária tem sido atribuída à interação indivíduo-ambiente. Neste estudo é apresentada uma revisão crítica da literatura com indicadores da influência de fatores filo e ontogenéticos no desenvolvimento da lateralidade, com particular ênfase aos primeiros anos de vida. A partir dos resultados discutidos, propomos que a lateralidade humana é um processo dinâmico, com efeitos marcantes das experiências sensório-motoras lateralizadas sobre a preferência manual e assimetrias interlaterais de desempenho motor. Palavras-chave: Dominância lateral; Manualidade; Filogênese; Ontogênese.
AbstractHuman laterality has been conceived as resulting, predominantly, from phylogenetic factors in human development, whereas individual-environment interaction is thought to play only a minor role. This study aims at presenting a critical review of literature showing evidence of the effect of phylogenetic and ontogenetic factors on the development of laterality, with particular emphasis on the first years of life. From the results presented, we propose that human laterality is a dynamic process, with sharp effects of lateralized sensorimotor experiences over manual preference and interlateral asymmetry of motor performance. Keywords: Lateral dominance; Handedness; Phylogenesis; Ontogenesis.Na teorização sobre origem e desenvolvimento da lateralidade humana dois pontos de vista antagônicos têm sido defendidos. A visão predominante é de que a lateralidade é essencialmente determinada por fatores filogenéticos (cf. Annett, 1978Annett, , 1996Annett, , 1999M. P. Bryden, 1990;Levy, 1976). Por esta concepção, a preferência manual é derivada de uma assimetria interlateral, originária da maior capacidade de controle motor com a mão preferida em comparação com a mão não-preferida. Oferece-se como explanação para as assimetrias interlaterais de desempenho a concepção de que os genes trazem embutidas em seu código especificações sobre o desenvolvimento diferenciado dos hemisférios cerebrais, determinando qual deles será o hemisfério dominante em relação a determinadas funções. Assim, considera-se que para pessoas destras o hemisfério cerebral direito seja o principal responsável por processamento paralelo e percepção de aspectos espaciais do ambiente, enquanto que o hemisfério esquerdo desempenha o papel principal no sequenciamento e temporização de movimentos (Goodale, 1990). Uma vez que o controle corporal pelo córtex cerebral é predominantemente cruzado, o lado corporal contrário ao hemisfério cerebral dominante tem maior potencial de controle do que o lado corporal ipsilateral. A partir de tais princípios, seria de se esperar uma vantagem generalizada e consistente de desempenho em tarefas motoras realizadas com o lado dominante em relação ao desempenho com o lado não-dominante, havendo relativa independência de fatores ambientais.Uma concepção antagônica foi formulada orig...