Este artigo pretende situar a importância do arquivo na descolonização dos museus e das suas coleções nas perspetivas tecnológica, discursiva e museológica. Tomando a coleção do Centro de Arte Moderna (CAM) da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) como objeto de estudo e os fundos dos Arquivos Gulbenkian como recurso, analisar-se-á o desenvolvimento do acervo na etapa final do império colonial português. Serão assim revelados dados inéditos sobre a aquisição de dois conjuntos de obras de arte adquiridas em Moçambique e Angola no âmbito das visitas, em 1963, do presidente da FCG, José de Azeredo Perdigão (1896-1993), aos dois territórios africanos, então, sob dominação portuguesa. Analisarei a aquisição destes conjuntos problematizando a sua invisibilidade na coleção, na narrativa institucional e nas exposições. Na concomitância entre as histórias da coleção e da instituição, questões como a autonomia e a neutralidade da FCG face ao Estado Novo (e à sua política colonial) serão também alvo de reflexão. Desta forma, e enquadrado no recente enfoque nas coleções e na responsabilidade dos museus no reconhecimento de omissões históricas persistentes, este trabalho procura dar visibilidade a um período mal conhecido (e problemático) da história de uma das mais relevantes coleções de arte moderna e contemporânea em Portugal, por comparação com o período posterior à sua musealização, em 1983.