Este ensaio discute teoricamente as implicações na/da saúde mental da população em situação de rua, considerando suas especificidades, condições de vida e os possíveis encadeamentos. Dialogando com Ignacio Martín-Baró, que apresenta a saúde mental como a materialização do caráter humanizador ou alienante das relações sociais e históricas na sociabilidade vigente, é possível compreender o contexto atual de vida dessa população e os atravessamentos que se constituem como fatores de risco e/ou proteção à saúde mental. A desigualdade social vivida por essa população molda estereótipos e fomenta preconceitos que desumanizam as relações sociais, cristalizam relações de poder e perpetuam violências: estes são os elementos que geram os fatores de risco. Não obstante, origina-se desse mesmo cenário a organização e mobilização coletiva que possibilita a reconstrução de novos modelos de identificação, a reivindicação de direitos e o fortalecimento do tecido social e comunitário, sendo os elementos que, contraditoriamente, emergem como fatores protetivos. Por fim, o debate acerca da saúde mental da população em situação de rua, numa ótica psicossocial, tem natureza dialética, portanto, convoca a refletir sobre os processos de opressão e libertação presentes no emaranhado de fios que formam a complexa teia da realidade da vida nas/das ruas.