O dossier temático, que agrupa a maioria dos textos que compõem o presente número, não podia ser mais oportuno, num momento em que sobram ataques aos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres sob a forma de legislação antiaborto, em vários países, ou a contestação à sua legalização noutros, em que registamos recuos ou objeções à educação para a cidadania nas escolas, e em que vemos decisões de tribunais que promovem a despenalização de agressores que infligem maus tratos e abusos sexuais a mulheres e meninas. Os desafios feministas, teóricos e metodológicos, ao Direito têm denunciado a ilegitimidade que se esconde por detrás da fachada da neutralidade e da racionalidade, conseguindo assim produzir ilegitimidade sociológica e normativa às leis e à sua aplicação. As lentes feministas do Direito têm vindo a reivindicar visões alternativas da justiça, hegemonizadas pelas conceções de legislaturas discriminatórias, de juízes e de outros agentes do campo judiciário. Os textos integrados no presente dossier não se limitam aos efeitos negativos que os campos jurídico e judicial têm sobre as mulheres ou sobre as comunidades LGBTQIA+; alargam as abordagens a experiências particulares relativas ao ensino e à mudança organizacional.Na secção de Estudos e Ensaios, os textos centram-se em questões diversas e igualmente prementes, sendo a temática abordada a única diferença relativamente aos textos integrados no dossier. Trata-se de artigos de pesquisa. Assim, Pedro Jerónimo, Carlos Ballesteros, Sónia de Sá e Ricardo Morais apresentam o seu estudo sobre "Jornalistas locais e condições laborais sob um olhar de género". Através de um inquérito a jornalistas de meios de comunicação social da Região Centro (Portugal), o estudo evidencia a existência de desigualdade entre homens e mulheres, sendo estas mais jovens, menos experientes, com contratos mais precários e enunciando piores expectativas quanto ao futuro. Os dois últimos textos dão-nos conta de experiências de investigação-ação. O primeiro de Cristiana Vale Pires, Maria Carmo Carvalho e Helena Carvalho, intitulado "Certificação Sexism Free Night: da visibilização do assédio sexual à criação de um roteiro de lazer noturno mais seguro e igualitário no Porto", baseia-se num inquérito eletrónico a 546 pessoas frequentadoras de estabelecimentos de lazer noturno (bystanders), mas sobretudo na intervenção junto de pessoas que gerem estes estabelecimentos, na cidade do Porto, no sentido de as sensibilizar para obterem a certificação Sexism Free Night e de darem formação ao seu pessoal. Desta intervenção (que envolveu 7 estabelecimentos e formação a 46 pessoas), resultou o reforço da convicção de que os ambientes de lazer noturno são contextos estratégicos de prevenção e intervenção em situações de assédio sexual -não apenas pela relevância das ações da gerência dos estabelecimentos, mas também de quem as frequenta. Mais uma vez, porém, também se chama a atenção para as limitações de projetos com financiamentos temporários. Por fim, María del Carmen Vera-Esteban e María Cristina Ca...