O humano não consome apenas o alimento que encontra na natureza, ele o prepara e/ou produz: a comida é também cultura e tecnologia. Mais ainda, o humano escolhe o que ingerir e a ingestão é (com)partilhada, o que denota os valores simbólicos e sociais de que a comida se reveste. Por isso, a fome ou a saciedade não são resultantes apenas do desequilíbrio ou equilíbrio proteico-calórico e de hidratação, mas também de memórias: imagens, cheiros, sons, histórias e desejos. A alimentação é, então, função orgânica que será sobredeterminada simbolicamente, se entrelaçará com um outro funcionamento humano, a linguagem, numa operação iniciada na interação mãe-bebê e encenada a partir da amamentação. Este artigo de pesquisa, a partir de uma casuística de 30 mães com bebês recém-nascidos, analisa a construção da posição materna em cenas alimentares com seus bebês, delineando suas características interacionais, suas consequências para a relação mãe-bebê, para o desenvolvimento da criança e para subjetividade dessas mulheres, inclusive em função de orientações técnicas, entre outras, de pediatras e de fonoaudiólogos sobre a alimentação de seus filhos. Os dados mostram que a amamentação é, na grande maioria dos casos, um desejo das mulheres, o que põe em realce o vigor e o valor da posição de alimentadora da mãe e, mais ainda, dela ser fonte do alimento do bebê. Observou-se, por fim, que a orientação especializada para as mulheres (do estudo) sobre a amamentação é feita, sobretudo, em período pós-natal, privilegiando sua importância quanto aos aspectos nutricionais da criança. Contudo, foi possível verificar, em muitas respostas das mães, que a amamentação constitui, principalmente, momento de prazer relacional, encenado pela intensa busca de interação com a criança, que reage com mudanças visíveis de comportamento corporal e porque olha para a mãe como resposta às suas palavras e carinhos, o que faz com que ela já reconheça aí intenção e comunicação.