Para a construção do presente texto, utilizamos documentos gestados pelo Tribunal do Santo Ofício e do Arquivo Histórico Ultramarino 1. Também usamos a descrição dos reinos do Congo, Matamba e Angola, deixada pelo missionário Capuchinho Cavazzi. No que se refere aos documentos inquisitoriais 2 , usamos os processos movidos pelo Tribunal religioso e denúncias feitas aos agentes inquisitoriais. Quanto aos documentos produzidos no âmbito do Conselho Ultramarino, trata-se de ofícios e cartas escritas pelo Governador de Pernambuco, José César de Meneses. Serão usados, também, documentos redigidos pela missão dos Capuchinhos italianos, ordens enviadas pela Rainha de Portugal, D. Maria I, e um parecer escrito pelo antigo Governador de Pernambuco, o Conde de Povolide. Para tanto, norteamos nossa análise a partir de bibliografia especializada sobre o tema dedicada aos estudos sobre a diáspora africana e as suas consequências no chamado Novo Mundo. Priorizamos discutir como essas práticas empregadas pelos sujeitos escravizados criavam relações constantes de barganhas, reivindicando seus espaços de liberdades por meio de suas práticas culturais, indo, dessa maneira, contra as ações empregadas sobre estas práticas. Cultura africana denunciada à Inquisição: o caso dos batuques no Recife Em documento expedido em 23 de abril de 1778, consta a "Relação dos Missionários Barbadinhos Italianos que para a América e África embarcam presentemente" 3. Dos quinze missionários embarcados, quatro tiveram como destino a Capitania de Pernambuco: Frei Constantino de Parma (posteriormente viria a ser o Prefeito das Missões), Frei Pedro de Bregossia, Frei Clemente de Moreta e Frei Pedro Lourenço de Loussalo. A mesma relação fora expedida no dia 28 de abril de 1778 para o Governador e Capitão General da Capitania de Pernambuco, José César, constando a mesma informação assinada por João Gomes de Araújo, "Oficial Maior desta Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos, [...] declarando haver a mesma senhora [D. Maria I] permitido o seu Real Beneplácito 4. Saíram às ruas de Recife, em 21 de dezembro de 1778, "levados do seu Apostólico espírito", os quatro Capuchinhos recém-chegados da corte, a mando de D. Maria I, Rainha de Portugal, e mais cinco sacerdotes do Hospício de Recife. Empenharam-se em dar um fim a danças e a batuques feitos por negros em praça pública. Para tanto, não pouparam esforços O caso dos batuques em Recife no século XVIII: africanos, italianos e portugueses em conflito