Este trabalho analisa o percurso de mudança da construção [meio que] no português brasileiro, fazendo-se uso de dados que abarcam um período de seis séculos (XVI-XXI), extraídos do Corpus do Português (DAVIES; FERREIRA, 2006; DAVIES, 2019). Propõe-se, com base no quadro teórico da Gramática de Construções Diacrônica (SOMMERER; SMIRNOVA, 2020; TRAUGOTT; TROUSDALE, 2013), que essa construção integra a rede formada pelo nó superior [X que], contudo, diferentemente de outras construções instanciadas por esse nó, [meio que] não se gramaticaliza como conjunção ou como índice de modalidade, mas, inicialmente, como advérbio e, posteriormente, como marcador discursivo. Ademais, propõe-se que o processo tenha sido desencadeado a partir da reanálise do NP complexo [Det meio [que...]]NP, compreendendo uma trajetória de mudança semelhante à das construções [kind of/kinda] do inglês (MARGERIE, 2010) e [en plan (de)] do espanhol (RODRÍGUEZ-ABRUÑEIRAS, 2020), o que atesta translinguisticamente o cline nome advérbio marcador discursivo, como propôs Rodríguez-Abruñeiras (2020). Adicionalmente, foram contemplados na análise os fatores de esquematicidade, de composicionalidade e de produtividade da construção [meio que]. Constatou-se que há uma tendência de queda dos usos lexicais (como NP complexo cujo núcleo é o nome meio ou como parte de um numeral seguido de que) no século XX e uma tendência de crescimento dos usos construcionalizados (como advérbio ou como marcador discursivo) a partir desse mesmo século, período em que ocorre a mudança, bem como que tais séries estão inversamente correlacionadas, conforme atestaram os testes estatísticos empregados na análise quantitativa do fenômeno.