O presente artigo procura ilustrar o modo como os desenvolvimentos das neurociências cognitivas poderão ajudar a compreender alguns dos processos psicológicos básicos e, simultaneamente, ser traduzidos para importantes domínios da psicologia aplicada, particularmente no domínio clínico. Exemplificaremos a partir de algumas linhas de investigação programática em curso nas diferentes subsecções do Laboratório de Neuropsicofisiologia da Escola de Psicologia da Universidade do Minho. As potencialidades metodológicas proporcionadas pela neurofisiologia, neuroimagiologia, neuromodelação, psicofisiologia, neurobioquímica e neurogenética serão exemplificadas nas suas aplicações à linguagem (e suas implicações para a compreensão da esquizofrenia), funcionamento sócio-cognitivo (e implicações para a compreensão das perturbações do neurodesenvolvimento), funcionamento executivo (com implicações para a compreensão das perturbações do espectro obsessivo), empatia (e implicações para a compreensão da psicoterapia), mecanismos de stress (com implicações para a compreensão das perturbações de ansiedade), e, finalmente, comportamento animal (com implicações para o conhecimento dos sistemas sensoriais e perceptuais).
Palavras-chave:Neurociências, Processos psicológicos, Psicopatologia, Neurodesenvolvimento, Psicoterapia.
INTRODUÇÃOComo já há mais de 6 décadas reconhecia Donald Hebb (1949) em The Organization of Behavior, os psicólogos não enfrentam, na sua demanda epistemológica, uma tarefa simples. Com efeito, a procura das leis que possam permitir a validação dos mecanismos de compreensão, predição e regulação do comportamento e da actividade mental, é tarefa de grande complexidade. O quesito afigura-se, por vezes, um verdadeiro trabalho de Sísifo, em que carregamos penosamente o nosso precioso objecto (i.e., pedra de mármore) até ao cume da montanha para constatar que, chegados ao topo, a pedra escorrega novamente pela encosta até ao ponto de partida. Talvez seja este o nosso castigo por ousar desafiar Zeus neste nosso projecto de nos substituirmos aquilo que 3 A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Óscar F. Gonçalves,