Sócio-histórico-culturalmente, corpos e subjetividades de mulheres negras são objetificados, animalizados, tidos como hipersexualizados, demonizados, manipulados, submetidos a violações dos direitos humanos e reprodutivos, desde tenra idade. Em uma estrutura social que lhes nega o direito da existência, mulheres negras são estupradas, inclusive, pelos companheiros, expostas a infecções sexualmente transmissíveis e a gravidez não planejada. Como agravante dessa contextura controversa, hedionda, execrável, comumente, gestantes negras sofrem racismo obstétrico, perpetrado por profissionais de saúde, mediante negligência, descaso, desrespeito, lapsos diagnósticos, dor causada intencionalmente, coerção, desvalorização da dor, abuso médico. O estudo tem o objetivo de analisar, sob a ótica da interseccionalidade, a gravidez não planejada, consequente da violência doméstica e sexual, e o racismo obstétrico, sofrido por mulheres negras. Realizou-se pesquisa qualitativa, descritiva, teórica, do tipo revisão narrativa da literatura, através da apreciação de estudos nas bases de dados Google Scholar, Redalyc, Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações, publicados no período de 2019 a 2024. Empregou-se os descritores violência doméstica e sexual contra a mulher, gravidez não planejada e racismo obstétrico, adicionados do operador booleano and. Foram compostas quatro categorias analíticas, a saber: (1) intersecção entre gênero, raça/etnia e decisões reprodutivas; (2) racismo institucional e violência obstétrica; (3) gravidez não planejada, racismo e controle sobre fecundidade; e, (4 ) violência doméstica e familiar no contexto reprodutivo. Evidenciou-se que a intersecção entre gênero e raça/etnia impacta na vulnerabilidade de mulheres negras à violência doméstica e sexual, assim como na injustiça sexual e reprodutiva, por meio da gravidez não planejada e vitimização por racismo obstétrico; concomitantemente, o racismo obstétrico concorre para iniquidades no acesso aos serviços de saúde. Afinal, a conjunção complexa e controversa entre racismo obstétrico, violência de gênero e vulnerabilidades sociais exige políticas públicas interseccionais eficazes, que dignifiquem as idiossincrasias, subjetividades e demandas das mulheres negras, a fim de assegurar os direitos sexuais e reprodutivos, o cuidado integral e a equidade racial.