A crescente transição global do consumo para alimentos industrializados tem desconectado os povos de seus ambientes e trazido consequências de ordem ecológica, econômica, social e cultural, com impactos negativos sobre a saúde pública. Com o avanço do modelo de desenvolvimento contemporâneo, as populações isoladas amazônicas vêm transformando a sua alimentação e os seus modos de vida. Esta realidade é vivida pelas comunidades locais na Floresta Nacional (FLONA) do Purus e tem se intensificado nos últimos dez anos com o aumento do consumo de alimentos industrializados, juntamente com a crescente importação das cidades de produtos agrícolas como arroz, feijão, legumes, farinha, que formam a base da alimentação regional, e tradicionalmente eram produzidos localmente. Frente a tal cenário, parte da comunidade local tem buscado há vários anos a reconstrução dos sistemas agroalimentares locais por meio da valorização da agricultura e do consumo de alimentos produzidos localmente, com o resgate de conhecimentos e práticas adaptadas ao ambiente amazônico. Dentro desse contexto, o presente trabalho busca apoiar a construção da soberania alimentar na FLONA do Purus, por meio de um diagnóstico exploratória organizada em dois capítulos. O primeiro capítulo traça, por meio da sistematização das experiências, uma retrospectiva histórica das ações da agricultura no território estudado. Para a sistematização foram realizadas entrevistas com informantes-chave, pesquisa documental e revisão bibliográfica sobre a agricultura na FLONA do Purus. A sistematização permitiu identificar diferentes fases de ações e direcionamentos da agricultura local na construção de uma rede agroalimentar local, através da valorização de práticas de trabalho coletivo, a constituição de novos polos de produção de alimentos, a experimentação agroecológica e o apoio técnico e logístico para a comercialização de alimentos locais. No segundo capítulo, o objetivo foi a caracterização de agroecossistemas locais atuais, com uma análise da situação dos principais polos de produção de alimentos da FLONA do Purus, a vila Céu do Mapiá (Vila), a comunidade Fazenda São Sebastião e Igarapé Mapiá (Fazenda) e as praias do Purus (Praias). Para esta caracterização foram integradas metodologias como a observação participante, entrevistas-semiestruturadas, caminhadas transversais e a análise dos atributos sistêmicos dos agroecossistemas por meio do método de análise econômico-ecológica de agroecossistemas (Método Lume). Os principais sistemas de cultivo são os roçados de corte e queima, sistemas agroflorestais, os quintais produtivos e os plantios de agropraias. A autonomia é um atributo sistêmico de maior destaque em todos os polos produtivos, já que os agricultores possuem uma baixa dependência de insumos para realizar suas práticas agrícolas. Além disso os agroecossistemas possuem uma grande diversidade de espécies o que possibilita diversas colheitas e a evolução de roçados para sistemas agroflorestais. A capacidade de adaptação foi maior na Vila devido as transformações sociais e o fluxo de pessoas neste polo produtivo. Entre as principais fragilidades das comunidades observa-se o baixo protagonismo da juventude em Vila e Fazenda, enquanto que nas Praias, devido ao isolamento geográfico e à vulnerabilidade das famílias, o atributo com menores avaliação foi a integração social foram a desses sistemas. A caracterização dos agroecossistemas permitiu identificar a realidade socioambiental das famílias, indicando que as ações futuras de fomento à agricultura, como acesso às políticas públicas para acesso à financiamento e equipamentos, capacitações e acompanhamento de sistemas agroflorestais e dos cultivos das agropraias. As comunidades da FLONA do Purus representam exemplos valiosos de desenvolvimento rural sustentável na Amazônia, ressaltando a importância da construção de redes agroalimentares locais e da busca pela soberania alimentar. Palavras-chave: Agroecologia. Alimentos Locais. Amazônia. Sistemas Agroalimentares.