Resumo O objetivo do artigo é desenvolver uma reflexão etnográfica sobre os sentidos de ‘civilização’ e ‘tempo dos antigos’ entre os Yuhupdeh, povo indígena do alto rio Negro, a partir de suas relações com a ‘mito-história’ no noroeste amazônico. A condição de ‘civilizado’ aparece no discurso yuhupdeh como forma de descrever o conjunto de mudanças em relação ao ‘tempo dos antigos’, quando seus antepassados viviam em pequenos grupos com intensa mobilidade pela floresta, caçando e coletando frutas do mato. Por outro lado, ‘tempo dos antigos’ também remete a narrativas míticas que incorporam a chegada dos brancos no conjunto de transformações que definiram a ordem das coisas no presente, estabelecendo as diferenças entre brancos e indígenas. Nesse sentido, história e mito não se caracterizam como domínios separados e excludentes, mas como diferentes formas de elaborar e dar sentido à chegada dos brancos, interpenetrando-se nos regimes expressivos e simbólicos dos coletivos indígenas do noroeste amazônico, sua mito-história. Em vez de um processo de aculturação ou perda cultural, ‘civilização’ parece funcionar como um ‘autoconceito’ da condição política indígena diante do contato mais intenso com o mundo dos brancos, não apenas revelando a consciência histórica do violento processo colonial, mas possibilitando diferentes projetos de futuro.