Neste artigo, procuro enfrentar o desafio um tanto complexo de inserir a longa história do catolicismo na América Latina na compreensão da noção de pessoa como constituída a partir da conversão ao pentecostalismo. Esta relação não é direta, nem óbvia, mas se cinco séculos de história cristã pregressa têm qualquer significado, a nossa análise da formação da pessoa pentecostal deve incluir uma reflexão sobre essa história. Por outro lado, se essa longa história simplesmente desapareceu no ar, a nossa análise deve, então, explicar a dissolução deste legado cultural. De qualquer maneira, as questões relativas à sedimentação da história, à persistência cultural, e à descontinuidade devem ser parte integrante da nossa abordagem.Parte dos autores que se detiveram sobre a formação da pessoa pentecostal 2 na América Latina têm enfatizado a capacidade desta nova religiosidade engendrar uma reforma cultural e social através da oferta de uma concepção alternativa de "mal". Com o advento do pentecostalismo, que é de longe a forma mais popular do protestantismo num Brasil predominantemente católico, dualismos relativistas vagamente definidos entre o bem e o mal, que eram forças presentes em algumas versões do catolicismo popular, do catolicismo progressista e das religiões afro-brasileiras, foram substituídos por dualismos claramente delimitados, provocando uma atitude militante de pessoas de ambos os lados. O ressurgimento da figura do diabo levou à produção de um amplo leque de práticas e rituais de purificação, resultando na reorganização de um grande volume de crenças e costumes sincréticos ou híbridos (Sanchis 1994;Birman 1997;Mariz 1999; Mafra 2002;Giumbelli 2002). Esta linha de análise foi freqüentemente acompanhada de uma interpretação que identificou o pentecostalismo como uma