Resumo: Este estudo propõe uma interpretação alegórica do romance No país das últimas coisas de Paul Auster, a partir de seu diálogo intertextual com Hawthorne e Bunyan, e da proposta de Walter Benjamin em Origem do drama barroco alemão, obra que apresenta uma perspectiva diferenciada tanto do conceito de barroco como da noção de alegoria.Palavras-chave: alegoria; intertextualidade; poéticas da modernidade.
IntroduçãoPaul Auster é um escritor contemporâneo norte-americano de ascendência judaica. O reconhecimento de sua obra e sua popularidade têm sido notórios, pois sua escrita apresenta flexibilidade e complexidade, de forma a atingir tanto a esfera dos acadêmicos como a do leitor comum. A obra de Auster é extensa e variada. No âmbito da ficção, há dezesseis livros publicados. A intertextualidade é inerente à escrita de Auster, pois nela se percebem diálogos com autores como Kafka, Knut Hamsun, Poe, Hawthorne e Blanchot, entre outros. Há também uma repetição de temas, noções e núcleos narrativos que perpassam todos os seus livros, interligandoos. Apresenta-se, aí, a ideia de uma escrita intertextual que dialoga, também, consigo mesma.A obra de Auster gerou vários trabalhos críticos publicados em revistas especializadas. Duas coletâneas de ensaios foram reunidas em livros ─ Bloom's modern critical views: Paul Auster e Beyond the red notebook: essays on Paul Auster. Há ainda o livro de Ilana Shiloh, professora de literatura americana na Universidade de Tel Aviv, e alguns textos disponíveis na rede virtual, como é o caso do ensaio filosófico de Gianluca Cuozzo, professor de filosofia da Universidade de Torino, traduzido para o português com o título de A equação mortal. Apesar da enorme gama de trabalhos críticos disponíveis sobre a obra de Auster, apenas alguns analisam o romance intitulado No país das últimas coisas, que será considerado aqui. Além disso, não há referência nestes ensaios críticos à alegoria, tema central do presente estudo. Por este motivo, procura-se apenas iniciar um conjunto de reflexões sobre as possíveis interpretações da literatura produzida por Auster pelo viés da alegoria.A análise proposta neste artigo é proveniente da imbricação de textos sugerida na epígrafe do romance: "Não há muito tempo atrás, passando pelo portão dos sonhos, visitei aquela região da terra em que fica a famosa Cidade da Destruição". 1 A frase é de Nathaniel Hawthorne no conto "A estrada de ferro celestial" (1843), que por sua vez é uma paródia baseada em O peregrino (1678), a obra-prima de John Bunyan. Quando lido a partir das perspectivas de Hawthorne e Bunyan, o romance de Auster se transforma de forma iluminadora. O peregrino é uma alegoria do século XVII, que retrata a caminhada espiritual de um cristão, desde sua conversão até sua morte,