Prezado Editor, Gostaríamos de comentar o artigo "Limiar de custo-efetividade: uma necessidade para o Brasil?" (Pinto et al., 2016). Como as autoras, acreditamos que a discussão sobre a adoção de um limiar de custo-efetividade (LCE) para tomada de decisão em saúde é tema central para a Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) e que vários métodos podem ser úteis para se chegar a um valor de LCE coerente, todos eles apresentando vantagens e limitações. Fazemos aqui algumas complementações sobre o assunto.A função das agências de ATS é fazer recomendações sobre a incorporação de medicamentos no sistema de saúde. De forma geral, falta transparência no processo de ATS por vários motivos: 1. Dados de eficácia e segurança retirados de ensaios clínicos randomizados, comumente financiados pela detentora da patente do medicamento, podem apresentar desfechos seletivos, doses e escalonamento de doses de medicamentos, análises estatísticas e amostras populacionais que introduzem viés e incerteza na conclusão do estudo (Heres et al., 2006). A manutenção da efetividade e segurança depende de resultados ex post; 2. As avaliações de custo--efetividade (ACE) são usualmente construídas a partir de modelos matemáticos nos quais diversos pressupostos não aplicáveis ao mundo real são adotados; 3. A estimativa de impacto orçamentário depende de uma série de pressupostos econômicos e epidemiológicos não validados; 4. Os valores recomendados de LCE fixos são, de forma geral, arbitrários e alguma razoabilidade é necessária para a avaliação dos resultados por parte dos avaliadores e decisores.Um valor de LCE bem definido pode ser útil para melhorar a transparência das ATS, diminuir a arbitrariedade do processo de decisão, dar sustentabilidade ao sistema de saúde e facilitar as negociações de preços com a indústria farmacêutica (Teerawattananon et al., 2014;Bertram et al., 2016;Pinto et al., 2016;. Os limiares são usualmente calculados por disposição a pagar, decisões prévias de incorporação (benchmark interventions) ou por meio dos valores recomendados pelo WHO-Choice, apesar das diversas limitações nessas abordagens. Há, entretanto, um crescente suporte à abordagem de custos de oportunidade (World Health Organization. Commission on Macroeconomics and Health, 2001;Marseille et al., 2015;Bertram et al., 2016; Paulden et al., 2016;Pinto et al., 2016;. Mais recentemente descritos, os modelos de "estante de livros" (Culyer, 2016;Remme et al., 2016), fronteira de eficiência (Institute for Quality and Efficiency in Health Care, 2009) e eficiência média do sistema (Claxton et al., 2015;Woods et al., 2016) são alternativas ao uso de valores fixos de LCE.Sob uma perspectiva de custo de oportunidade, como o LCE indica aquelas tecnologias que são eficientes para incorporação, não é possível que o orçamento e o limiar sejam simultaneamente fixos. A ideia de implantação do princípio de custo de oportunidade é que, para a incorporação de novas tecnologias que impõe custos adicionais ao sistema, em um contexto de escassez de recursos, haverá deslocament...