Introdução: A elevação de troponina é frequente nos doentes internados. O seu significado e classificação (lesão miocárdica crónica versus aguda versus enfarte agudo de miocárdio (EAM), quer tipo 1, quer tipo 2) não se encontram esclarecidos. O objectivo deste estudo foi avaliar o significado e classificar as elevações de troponina em doentes internados numa enfermaria de Medicina Interna.
Material e Métodos: Estudo retrospectivo de doentes internados, num período de dois anos, numa enfermaria de Medicina Interna, a quem foram pedidos, pelo menos, 2 doseamentos de troponina I, ao critério do médico assistente, e que tiveram pelo menos um valor acima do limite de referência de 0,1 ng/ mL. A população foi caracterizada quanto à demografia, factores de risco cardiovascular, antecedentes clínicos, achados clínicos e laboratoriais, terapêutica efectuada e prognóstico. Foi interpretada a elevação de troponina de acordo com a quarta definição de EAM.
Resultados: Foram incluídos 90 doentes, com idade média de 83 anos (± 8,1), sendo 52% do sexo masculino. Cumpriram critérios de EAM 60 doentes (66%), sendo que os restantes 30 doentes (33%) eram classificáveis como lesão miocárdica aguda, sem EAM. Não encontrámos diferenças clínicas, no tratamento e prognóstico entre estes dois grupos de doentes, à excepção da idade (84 ± 7 vs 81 ± 10 anos, respectivamente, p = 0,039). Os doentes tinham um performance status baixo (43% ECOG 3 ou 4), hipertensão arterial (89%), insuficiência cardíaca (51%), diabetes mellitus tipo 2 (50%), insuficiência renal crónica (35%), fibrilhação auricular ou flutter (35%) e enfarte agudo de miocárdio prévio (33%). A apresentação clínica incluiu dispneia em 44% e dor torácica em 13%. À data da alta, 64% dos doentes foram medicados com estatina e 58% com pelo menos um anti-agregante plaquetário. A morte ocorreu durante o internamento em 17%, sendo que a mortalidade a 30 dias foi de 27% e a um ano de 51%.
Conclusão: Neste estudo, verificámos que, dos doentes com elevação de troponina compatível com lesão miocárdica internados numa enfermaria de Medicina Interna, 66% cumpriam os critérios de definição de EAM, enquanto os restantes 33% tinham lesão miocárdica aguda, sem EAM. À excepção da idade (mais elevada nos doentes com EAM) não houve diferença significativa nas características clínicas, abordagem ou prognóstico entre os dois grupos. Os doentes eram idosos e frágeis, com múltiplas comorbilidades, tendo a morte ocorrido duran-te o internamento em 17%, aos 30 dias em 27% e ao 1 ano em 51%, apesar de prescrição de estatina em 64% e de antiagregação em 60%.