Resumo Através da paisagem, dos sítios arqueológicos, das aldeias antigas, dos lugares com histórias do passado e da cerâmica arqueológica da bacia do rio Trombetas (Pará, Brasil), iniciamos uma discussão a partir de pontos de vista das arqueologias tradicional e indígena. Essa região é habitada por diversos povos indígenas, a maioria de origem Karib, tal como Wai Wai e Katxuyana. Tanto os objetos cerâmicos, em especial, os apliques zoomorfos Konduri, quanto os sítios, com grafismos rupestres e terra preta têm relação com histórias antigas, seja dos indígenas, seja de espíritos da natureza. A Arqueologia tradicional tende a lidar com a cultura material a partir de seus atributos formais e simbólicos, assim como sua referência cronológica, para reconstruir modos de vida de povos do passado. Já para os anciões indígenas, quando ouvidos, esses objetos e lugares trazem para superfície e para o presente aquilo que já foi ‘esquecido’ e ‘enterrado’ no passado.
A Arqueologia indígena está muito mais para ser lida e praticada no plural do que no singular, tanto no que tange as suas práticas e sujeitos, como no seu desenrolar teórico. Nesta apresentação farei algumas reflexões sobre a pluralidade deste termo a partir de duas experiências de pesquisa própria. A primeira, de uma pesquisa que realizei, no âmbito do mestrado e doutorado, na região do Rio Trombetas (PA); território tradicional de muitos povos, incluindo os Wai Wai. E a segunda, a partir da minha prática com professora de estudantes indígenas da arqueologia e antropologia na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA).
A expansão desenfreada do grande capital pelo país segue deixando comunidades locais, já marginalizadas, em situações ainda mais precárias. O presente artigo (Manifesto1) traz uma reflexão crítica sobre a atuação de arqueólogos enquanto cúmplices, sendo coniventes e participantes de processos ilegais e ilegítimos de expropriação e de espoliação de territórios tradicionais, bens culturais e recursos naturais. A atuação acrítica da Arqueologia de contrato nas obras do PAC, como exemplo repetido ad nauseum do conundrum em que nos situamos, não é uma inexorabilidade de nossa disciplina, é uma escolha política. Outras arqueologias eram possíveis antes e continuam sendo, mas devem ser retomadas e postas em prática com urgência. Nosso primeiro compromisso é com as gentes, não o capital.
Este artigo trata das interações entre populações indígenas e não indígenas no sul do Espírito Santo (costa sudeste do Brasil) nos séculos XVIII e XIX, a partir de uma abordagem da arqueologia interpretativa combinada a teorias sobre a agência dos humanos e dos objetos. Sua primeira parte é uma discussão crítica sobre a assimetria epistemológica, estabelecida e mantida ao longo de séculos de colonialismo, entre histórias locais e a história da colonização americana pelos ocidentais. A partir de um estudo de caso, discute-se como a mesma metanarrativa do devastador impacto ocidental sobre populações nativas, consideradas culturalmente estáticas e socialmente passivas, opera em modelos teóricos arqueológicos correntes e no discurso nacionalista do século XIX sobre a conquista dos índios do Espírito Santo. Em seguida, apresenta-se uma perspectiva alternativa de estudo do aparato material tupi setecentista, atenta à noção indígena de reciprocidade e ao potencial do mundo material para a mobilização de ações coletivas. Com o contexto interpretativo construído para os sítios arqueológicos do Espírito Santo, procura-se discutir, a partir de cerâmicas, líticos, manuscritos e mapas, a ação tupi na colonização europeia.
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