Antropólog(a)s têm se dedicado, ao menos desde Franz Boas, a investigar as relações entre natureza e cultura. No alvorecer do século XXI, este interesse recorrente vem sendo alterado diante de novas torções. Um conjunto de “etnógrafo(a)s multiespécies” começaram a depositar ênfase inédita na subjetividade e na agência de organismos cujas vidas estão emaranhadas às vidas humanas. A etnografia multiespécies emergiu na interseção de três linhas de investigação interdisciplinares: os estudos ambientais, os estudos sociais da ciência e da tecnologia (STS) e os estudos animais. Começando pelos clássicos assuntos etnobiológicos, plantas úteis e animais carismáticos, etnógrafo(a)s multiespécies igualmente convidaram organismos pouco estudados – tais como insetos, fungos e micróbios – para a conversação antropológica. Este(a)s antropólog(a)s reuniramse no Salão Multiespécies (Multispecies Salon), uma mostra de arte, onde as fronteiras de uma interdisciplina emergente foram exploradas em meio a uma coleção de organismos vivos, artefatos das ciências biológicas e surpreendentes intervenções biopolíticas.
Este artigo discute vestígios materiais – fragmentos cerâmicos e objetos industriais (de ferro e vidro) encontrados no território Karitiana, Rondônia, bem como as interpretações indígenas destes no processo de definição de sua territorialidade, algo que leva a consequências teóricas importantes para uma renovada reflexão sobre a história e a etnicidade na Amazônia indígena. A partir disso, especula algumas aproximações entre a Antropologia e a Arqueologia, na forma de uma crítica indígena aos vestígios arqueológicos e na reflexão acerca de uma mútua fertilização das disciplinas em contextos de pesquisa de campo.
A região do alto rio Madeira e seus formadores – que corresponde ao estado de Rondônia e às áreas vizinhas do noroeste do Mato Grosso, sul do Amazonas e oriente boliviano – apresenta uma notável diversidade de populações indígenas falantes de línguas de várias famílias do tronco Tupí (Tupí-Guaraní, Arikém, Ramaráma, Puruborá, Mondé, Mundurukú, Tuparí e Mawé). Esta riqueza foi apontada por vários autores que refletiram sobre essa região, tendo-a visitado ou não. As advertências destes pesquisadores, contudo, não garantiram uma continuidade no interesse pela etnologia indígena na bacia do alto Madeira, e não resultaram em uma produção consistente e integrada que buscasse desvendar as dinâmicas atuais e históricas dessa diversidade. Em resumo: nosso conhecimento das culturas Tupí em Rondônia e adjacências é pobre, disperso e pouco sistematizado. É tarefa necessária que a etnologia indígena dos Tupí na bacia do alto Madeira tome um rumo coeso, abrindo espaços de interlocução e integrando seus achados, com vistas a incrementar a produção antropológica e histórica acerca dessas populações e a refinar nosso conhecimento sobre cada uma de suas culturas, além dos cenários interétnicos e das trajetórias históricas locais, regionais e mesmo suprarregionais. Este artigo tem como objetivo mapear a produção etnológica sobre os grupos Tupí na região aqui definida como “Grande Rondônia”, e apontar algumas possibilidades e estratégias de pesquisa que poderão vir a incrementar o conhecimento sobre a riquíssima diversidade social, cultural e linguística da região.
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