A partir da pergunta feita por Virginia Woolf em seu ensaio Como se deve ler um livro? e de seu vivo interesse pela figura do leitor comum, neste artigo deslocamos a análise do campo literário para o teatral de modo a problematizar a figura do espectador. Com o intuito de investigar as singularidades e potencialidades das quais o olhar do espectador comum (propositalmente enfocado aqui como espectador qualquer) estaria investido, o artigo mobiliza dois personagens: um crítico, descrito por Diderot em seu Discurso sobre a poesia dramática como um espectador ideal, e uma prostituta aficionada por tragédias gregas, interpretada pela atriz Melina Mercouri no filme Nunca aos Domingos, de Jules Dassin. Buscando diferir o olhar do espectador comum daquele que seria o seu extremo oposto, o especialista, especificamos dois procedimentos distintos presentes na relação entre o olhar e a obra: o gesto hermenêutico, articulando o saber a partir de um campo transcendental, e o gesto-qualquer, recusando exterioridades e fundando um espaço de imanência.
Dialogando com a perspectiva histórica adotada por Raymond Williams em sua análise sobre a experiência trágica, este artigo perspectiva investigar conexões entre o tempo presente e a tragédia. Com base em disputas políticas operadas a partir do par memória-esquecimento, focalizamos a prática da exumação como plataforma para pensarmos a possibilidade de tragédia no contemporâneo. Tal prática é aqui entendida como um procedimento que, ao instaurar ruptura e violência em relação à memória e aos vestígios dos mortos, permite a abertura de um espaço agonístico de tensão política. Dessa maneira, trazemos à tona episódios do período da abertura democrática brasileira (1975-1985) que sublinham o diálogo entre o Estado, a cultura e a produção de narrativas sobre o país. Por fim, aproximando este período do projeto governamental respaldado pela eleição de 2018, avizinhamos os sentidos da experiência trágica contemporânea à estruturação de uma arquitetura política que desprezaria o gesto da exumação em prol da defesa do esquecimento histórico e da irreversibilidade das cinzas.
Esta investigação teve seu início institucional em 2015 e suas últimas linhas foram escritas em janeiro de 2018. Mas, talvez, ela tenha começado a ser elaborada em dezembro de 1987 e terminado num tempo ainda desconhecido. Ou, ainda, tudo tenha sido disparado há muito tempo atrás, antes dos começos oficiais: por outras pessoas cujo traço de vida antecedeu a minha presença no mundo ou que corre em paralelo a ela no curso desses dias: minha sorte. E pode-se também acreditar que tudo se passou no intervalo entre o passo, o disparate e uma nova moradaaquilo que se agita e se acalma no entusiasmo. Há a pergunta que se sobressai: afinal, quem escreve? E a voz no plural que se enuncia ao longo de toda esta escrita tem sua razão de ser na vontade de convívio com a pergunta. Em meio às turbulências e conflitos dos quais os documentos históricos são vestígios e na indiferença com a qual o arquivo, muitas vezes, nos responde, existem também os encontros, os diálogos e as correspondências. E, como disse Agnès Varda, um elo é a possibilidade de alguma paz em meio ao caos já sabidos de antemão. E, aqui, agradeço às pessoas que ofereceram a essa investigação sua possível paz: a vida também é feita de graça e de corpos que se roçam, às vezes com delicadeza. Começo agradecendo ao orientador e parceiro mais avizinhado deste percurso, o prof. Julio Groppa Aquino. Agradeço a ele pelo estranho e intenso convite para me aventurar nessa possibilidade de se fazer pesquisa e, acima de tudo, de se pensar o mundo e seus vestígios. Acima de tudo, agradeço ao que se deu em nosso respeito mútuo ao longo desse processo. Agradeço, ainda, por poder assistir ao vigor de sua aguda presença que, em alguns momentos, também abre espaço para a exposição da suavidade, do desgaste, do zelo, da ira, da graça, da pequenez e da grandeza de se situar na arena dos encontros do mundo como professor e orientador. E é desdobrando essa acuidade de presença no pensamento que sigo agradecendo aos muitos parceiros que escrevem esta pesquisa comigo:
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