<p>A sociedade indígena Huni Kuĩ caracteriza-se pela divisão sexual do trabalho bem definida e de similar importância cultural. As atividades domésticas são estritamente femininas, especialmente no que concerne aos preparos culinários. Este estudo objetivou analisar o papel das mulheres nos processos que envolvem a alimentação, bem como registrar práticas alimentares em três aldeias do povo Huni Kuĩ da Terra Indígena Kaxinawá do Baixo Rio Jordão, estado do Acre, Amazônia ocidental brasileira. Utilizou-se metodologias das etnociências, como observação participante e entrevistas abertas e semiestruturadas, exclusivamente com mulheres. O processo de seleção das colaboradoras ocorreu pela técnica de amostragem “bola de neve”: foram 36 interlocutoras, entre 18 e 82 anos, as quais participaram também de visitas conduzidas nas cozinhas e trilhas guiadas nos agroecossistemas. Para análise dos dados valeu-se de grupos focais e revisão etnográfica. Constatou-se a importância das mulheres nos processos que envolvem a alimentação, desde a produção alimentícia e confecção de utensílios, passando pela elaboração dos preparos até o próprio servir da refeição. Identificou-se uma totalidade de elementos articulados pelo saber tradicional feminino, que criam e recriam um universo de abundância, bem-estar e diversidade. Nesse lugar social, a mulher expressa conhecimentos materiais e simbólicos da diversidade vegetal que a circunda. Devido às funções desempenhadas, elas se constituem enquanto agentes de transmissão deste saber sobre a biodiversidade alimentar. Há, contudo, necessidade de salvaguardar o arcabouço cultural frente às transformações históricas que o povo enfrenta no sistema alimentar, relativas à substituição de alimentos culturais por produtos industrializados. Sob essa ótica, é preciso valorizar o saber feminino e, consequentemente, a alimentação tradicional. Sugere-se o fortalecimento de políticas públicas, privilegiando as tomadas de decisão focadas no papel das mulheres na agricultura e na alimentação. O estudo reforça a necessidade de fomentar os hábitos culturais para garantir a segurança e a soberania alimentar e nutricional das populações nativas.</p>
A Reserva Extrativista Chico Mendes (RESEX CM) surgiu em contraponto ao modelo de desenvolvimento agropecuário idealizado para a Amazônia na década de 1960. Possui como fundamento as reivindicações de populações extrativistas, cujo cerne é o uso e manejo adequado dos recursos naturais associado à geração de renda e à garantia de permanência nos territórios. Contudo, devido à falta de investimentos e infraestrutura para o escoamento e comercialização dos produtos da biodiversidade, moradores da RESEX implementaram a pecuária em parte das áreas produtivas. Além de gerar impactos negativos à paisagem florestal, esta atividade não condiz, a médio e longo prazo, com o modo de vida extrativista. Diante desta contradição, nosso estudo dedica-se a registrar como moradores de uma das comunidades da RESEX interpretam o cenário atual e quais as possíveis estratégias de inovação. O estudo foi desenvolvido por meio das metodologias participativas FOFA, “rio da vida” e mapa mental. Constatamos as transformações históricas, econômicas, socioculturais e ambientais que vêm ocorrendo desde o período da borracha (final do século XIX) até o momento. Quanto aos desafios enfrentados pela comunidade, destacamos a luta de alguns núcleos familiares contra a implementação da pecuária extensiva e consequente desmatamento exacerbado, assim como conflitos relacionados a retirada clandestina de madeira e caça ilegal por invasores. Já no que se refere às perspectivas dos comunitários participantes, observamos o interesse por uma organização socioeconômica estruturada, a partir de ferramentas como associativismo e cooperativismo. Junto aos comunitários, detectamos a importância do selo de identificação geográfica e do fortalecimento de cadeias de valor já existentes, como também a necessidade de fomentar novas oportunidades de renda através de produtos regionais agroecológicos e produtos florestais não-madeireiros.
The Kaxinawá indigenous people (auto-identified as the Huni Kuĩ) are native to the western Amazon, on the Brazilian border with Peru, and have an extensive biodiversity-related knowledge, which is parti of a coherent social-ecological system. Our study investigated native knowledge of edible forest plants, in three communities within the Kaxinawá Indigenous Land on the Lower Rio Jordão, Acre state, Brazil. The principal methods used were participant observation, open and semi-structured interviews and walk-in-the-woods. The study recorded 89 native food species. Some 60% are managed in food-production areas, with 56% of the recorded species have received little or no scientific study of their food potential. The role which natural systems play in Huni Kuĩ society is indicated by the management and use of a high diversity of native species, which contributes to food security and nutritional sovereignty. However, there is a progressive under-utilization and substitution of forest species, due to the introduction of cultivated exotic species and the increase in consumption of industrialized products. An enhancement of the value given to native food-plants is needed to encourage continuing autonomy of production, and diet diversification, as well as the conservation of sociobiodiversity of traditional peoples in the Amazon through sustainable management practices of the current social-ecological system.
A sociedade indígena Huni Ku? caracteriza-se pela divisão sexual do trabalho bem definida e de similar importância cultural. As atividades domésticas são estritamente femininas, especialmente no que concerne aos preparos culinários. Este estudo objetivou analisar o papel das mulheres nos processos que envolvem a alimentação, bem como registrar práticas alimentares em três aldeias do povo Huni Ku? da Terra Indígena Kaxinawá do Baixo Rio Jordão, estado do Acre, Amazônia ocidental brasileira. Utilizou-se metodologias das etnociências, como observação participante e entrevistas abertas e semiestruturadas, exclusivamente com mulheres. O processo de seleção das colaboradoras ocorreu pela técnica de amostragem “bola de neve”: foram 36 interlocutoras, entre 18 e 82 anos, as quais participaram também de visitas conduzidas nas cozinhas e trilhas guiadas nos agroecossistemas. Para análise dos dados valeu-se de grupos focais e revisão etnográfica. Constatou-se a importância das mulheres nos processos que envolvem a alimentação, desde a produção alimentícia e confecção de utensílios, passando pela elaboração dos preparos até o próprio servir da refeição. Identificou-se uma totalidade de elementos articulados pelo saber tradicional feminino, que criam e recriam um universo de abundância, bem-estar e diversidade. Nesse lugar social, a mulher expressa conhecimentos materiais e simbólicos da diversidade vegetal que a circunda. Devido às funções desempenhadas, elas se constituem enquanto agentes de transmissão deste saber sobre a biodiversidade alimentar. Há, contudo, necessidade de salvaguardar o arcabouço cultural frente às transformações históricas que o povo enfrenta no sistema alimentar, relativas à substituição de alimentos culturais por produtos industrializados. Sob essa ótica, é preciso valorizar o saber feminino e, consequentemente, a alimentação tradicional. Sugere-se o fortalecimento de políticas públicas, privilegiando as tomadas de decisão focadas no papel das mulheres na agricultura e na alimentação. O estudo reforça a necessidade de fomentar os hábitos culturais para garantir a segurança e a soberania alimentar e nutricional das populações nativas.
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