Este artigo analisou os processos de estigmatização, rotulação e desvio no ambiente escolar, tomando como objeto heurístico o romance Nossa Senhora do Nilo, da escritora ruandesa Scholastique Mukasonga (2017). Articulando testemunho e elaboração ficcional, a escritora expôs as marcas do colonialismo diante das relações culturais, sociais e religiosas ao ilustrar o cotidiano de uma escola católica exclusiva para meninas (filhas da elite política e econômica hutu de Ruanda, em sua maioria) em meio ao conflito entre tutsis e hutus que resultou em uma guerra civil (1990-1994) e, posteriormente, no genocídio de Ruanda (1994). O artigo está dividido em três seções. Na primeira, tratamos de como a autora elabora o trabalho da memória em sua obra literária. Na segunda, apresentamos os conceitos de estigmatização, rotulação e desvio à luz de obras clássicas, mas também de estudos contemporâneos sobre o tema. Na terceira seção, analisamos o capítulo “O nariz da Virgem”, de Nossa Senhora do Nilo, articulando-o aos fenômenos da estigmatização e da rotulação que, naquele contexto, contribuiu para que estudantes tutsis fossem perseguidas e mortas no liceu, com o consentimento silencioso ou declarado dos professores e dirigentes da instituição. Nas considerações finais, refletimos sobre a fecundidade de estudos que conjuguem analiticamente os campos da Sociologia e da Literatura.
RESUMO Pretendo neste texto apresentar reflexões conceituais e metodológicas produzidas em pesquisa de doutorado que se dedicou à reconstrução sociológica da trajetória de uma mulher, trânsfuga de classe, chamada Juscelina. A pesquisa teve duração de 16 meses, dentro dos quais foram realizadas entrevistas, pesquisa em variados tipos de documentos e incursões etnográficas. Dos muitos desafios da investigação, apresento aqui duas questões que se articulam. A primeira refere-se à utilização do conceito de trânsfuga. A segunda discute o valor sociológico da pesquisa biográfica. Praticando o artesanato intelectual que constrói explicações no entrelaçamento entre a pesquisa de campo e a literatura das ciências sociais, exponho o processo que me levou a considerar produtivo o conceito de trânsfuga para o caso em análise, e argumento que as críticas do campo sociológico ao método biográfico, exemplarmente sintetizadas no clássico “A Ilusão Biográfica”, de Pierre Bourdieu, devem ser relativizadas em consideração às maneiras como se procede em cada investigação empírica. Para tanto, me valho da minha experiência e dos argumentos de Schwartz (1990) e Lahire (2010). Concluo que as pesquisas biográficas em ciências sociais não precisam subsumir os relatos pessoais às dimensões estruturais que também explicam a trajetória (origem social e geográfica, cor, gênero, nível de escolaridade, etc.), mas sim articular a riqueza barroca das visões de si, das relações construídas e do mundo observado e vivido à reconstrução dos constrangimentos estruturais que pavimentam os percursos individuais.
O artigo focaliza uma realidade atípica no Brasil e pouco contemplada no debate educacional do país: a experiência de famílias de camadas médias com filhos em escolas públicas. Insere-se no campo da sociologia das relações família-escola, mais especificamente, dos estudos sobre escolarização nas camadas médias. Os dados empíricos foram obtidos em uma escola pública municipal de Belo Horizonte que, por sua reputação, atrai um número significativo de famílias de camadas médias. Foram realizadas observações participantes de reuniões da Comissão de Famílias, criada por iniciativa de um grupo de mães, além de entrevistas com mães que integravam a Comissão. Reforçando estudos internacionais e nacionais sobre o tema, os resultados evidenciam que ter os filhos na escola pública gera ansiedade e tensão para essas famílias. Elas buscam administrar a situação por meio da escolha criteriosa do estabelecimento de ensino e do desenvolvimento de um conjunto de estratégias que visam minimizar os riscos dessa opção e assegurar a formação desejada para a prole.
Este trabalho pretende contribuir para os estudos da relação família-escola, de gestão e organização escolar, trazendo como agente desta trama o gestor escolar e sua capacidade de mobilizar recursos de senso prático para enfrentar os conflitos e tensões do cotidiano de um estabelecimento situado em um território vulnerável. Munidos de uma espécie de perspicácia sociológica “espontânea”, os gestores criam estratégias com o objetivo de sensibilizar as famílias para as necessidades da ordem escolar. O artigo analisa duas dessas estratégias: a) utilização de uma pedagogia do controle emocional que envolve aconselhamento e sutis demonstrações de respeito e consideração aos alunos e suas famílias e b) invocação de discursos de matiz religiosa para resolver conflitos institucionais, sobretudo de ordem disciplinar. A metodologia incluiu observação de campo ao longo de quinze meses e sete entrevistas semiestruturadas com os diretores e coordenadores pedagógicos. Concluiu-se que as estratégias mobilizadas, embora não sejam suficientes para dirimir as dissonâncias entre as ordens escolar e doméstica, iluminam aspectos menos explícitos e também menos estudados da relação entre escola e famílias, e nesse sentido auxiliam na compreensão de como essa relação se constitui na convivência cotidiana.
No livro recém publicado L’Enquête Narrative en Sciences Humaines et Sociales, Hervé Breton explora o tema da pesquisa narrativa e sua pertinência no domínio das ciências humanas e sociais. O autor analisa a expressão do vivido, em primeira pessoa, por meio de uma abordagem teórica e metodológica clara, consistente e bastante rigorosa. Estruturado em 4 partes, o livro procura delinear o estatuto da experiência na teoria do conhecimento: se o trabalho investigativo é inextricável da interpretação da experiência, é necessário propor métodos de acesso aos processos pelos quais a experiência se transforma em linguagem e esta se configura em narrativas. Trata-se de um convite para todos aqueles que se interessam pelo campo da pesquisa narrativa e os desafios contidos nesta abordagem rica e complexa.
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