Resumo: A partir da análise da fonte fílmica O poço (2019), construímos uma narrativa histórico-política do uso do corpo e das subjetividades neoliberais como produto do Estado biopolítico no Brasil a partir de 1930, no período denominado Era Vargas. A condição desse Estado biopolítico é dada a partir da função de consolidar o capitalismo industrial, incluir/excluir os trabalhadores urbanos, promover os direitos sociais e o uso da biomídia.Nesse contexto, a biopolítica produz o estado de exceção e os campos de concentração (AGAMBEN, 2014a) que, ficcionalmente, encontramos na mensagem fílmica da mediocridade humana por meio da ganância, do egoísmo e do consumo, em que a maioria vive sob a política da sobrevivência, corpo e subjetividade, garantindo as desigualdades sociais, a "cultura do ralo" e o lixo social.Palavras-chave: Estado. Biopolítica. Era Vargas. Cinema contemporâneo. Desigualdade social.
INTRODUÇÃOEm tempos de sindemia 1 no mundo e, sobretudo, do marco de mais de 500 mil mortos no Brasil decorrentes da biopolítica em estado de exceção, o corpo e as subjetividades encontram-se, ainda mais, à mercê da política da sobrevivência, da condição de homo sacer e marginalizados dos meios de consumo e de proteção. Não longe disso, numa trajetória secular, o cinema vem traduzindo sonhos, desejos e traumas sociais e individuais, vislumbrando conquistas e derrotas, ficções e dramas baseados na vida real. Em nosso contemporâneo, a biopolítica e o cinema fundam-se no que se pode chamar de pós-verdade, pós-democracia e não corpo 2 , e coloca-nos, como causa e efeito das relações sociais, no limbo extenuante das 1 -Em entrevista à BBC Brasil o médico Merril Singer comenta a sua teoria sobre a sindemia a partir dessa frase criada por ele nos anos 1990 (PLITT, 2020).2 -É a condição do não pertencimento e da antropotécnica que envolve o corpo, conduzido pelas subjetividades neoliberais e os dispositivos que padronizam a cultura e o consumo do indivíduo-individualista. O não corpo é tudo aquilo que não depende do indivíduo, mas que o transforma, antropotecnicamente, em outro corpo e constrói subjetividades, que Foucault (2019) denominaria dispositivos e Agamben (2014a), oikonomia.