O comportamento antissocial em crianças possui diversas conceituações, sendo considerado unânime na literatura científica a importância do contexto familiar na compreensão do seu desenvolvimento. Assim, elegeu-se a experiência da parentalidade como alvo de investigação científica para a compreensão do complexo processo de produção e manutenção da tendência antissocial infantil. Este estudo teve por objetivo compreender a relação entre a maneira como os pais vivenciam suas experiências parentais e associá-la ao desenvolvimento do Self de meninas com problemas de comportamento. Tratou-se de uma investigação qualitativa, descritiva e exploratória. Participaram deste estudo 4 famílias de nível socioeconômico médio e médio/baixo, que tinham uma filha que apresentava comportamentos compatíveis com a descrição da tendência antissocial. As familias participantes foram: uma família composta por pai, mãe e filha, e três famílias monoparentais femininas. Foram realizados de 2 a 4 encontros: um encontro com os pais, para a apresentação da pesquisa, coleta de dados demográficos, aplicação de um questionário de saúde mental e um questionário referente à saúde mental de suas filhas; um encontro somente com o pai e outro somente com a mãe, em que alguns cartões selecionados do Teste de Apercepção Temática Infantilforma animal (CAT-A) foram apresentados para que eles pudessem falar, a partir das figuras, sobre a experiência de ser pai/mãe de sua filha. Com a criança, foi realizado um encontro em que os mesmos cartões do CAT-A usados com os pais foram apresentados, solicitando que elas contassem uma história sobre cada um deles. A estratégia metodológica utilizada na pesquisa foi a das "Narrativas Psicanalíticas". Efetuou-se uma interpretação do material obtido no contato com a mãe, outra do contato com o pai, e outra do contato com a criança e, por fim, uma síntese de cada família, no intuito de relacionar a experiência parental e o desenvolvimento do Self de cada menina. Os pais relataram momentos de de-privação na vida das crianças, dificuldades para aproximar-se emocionalmente delas e de compreender suas necessidades, não auxiliando-as a criarem uma função mental de elaboração de suas angústias e ansiedades. Em relação à maneira de sentir a parentalidade, essa pareceu ser permeada pelas de-privações dos próprios pais, vividas ao longo de suas vidas, que dificultaram a maturação de recursos psíquicos aptos a digerir e assimilar as ocorrências e frustrações vividas em suas trajetórias, o que desencadeou uma dissociação defensiva que inviabiliza a elaboração dos lutos. Dessa forma, a dificuldade dos mesmos para acessar os próprios afetos, leva à escassez de encontros emocionais verdadeiros entre pais e filhas, o que intensifica os sintomas antissociais das mesmas. Ainda, em relação ao desenvolvimento emocional das meninas, observou-se a manifestação do falso Self em detrimento do verdadeiro; identificou-se também a presença de uma depressão latente, e o uso de defesas maníacas como medida de sobrevivência a essa condição.