Este trabalho investiga o sincretismo da morfologia passiva em latim. Nessa língua, o sufixo que realiza a voz passiva (cujo default é realizado como -r) também é encontrado em construções impessoais, anticausativas e contextos médios, bem como nos verbos depoentes, classe definida por sempre se manifestar na forma passiva, embora possua sentido ativo. Esse tipo de sincretismo não se limita ao latim, sendo observado em outras línguas de diferentes famílias e, ocasionalmente, envolve também o domínio dos verbos reflexivos. No intuito de oferecer uma explicação de cunho amplo, parte-se dos trabalhos anteriores de Schäfer (2008) e Lazzarini-Cyrino (2015) e, sob o modelo teórico da Morfologia Distribuída (HALLE & MARANTZ, 1993; MARANTZ, 1997), apresenta-se uma proposta de derivação que postula que a marca sincrética é, na verdade, um argumento verbal não referencial – isto é, uma variável – que é incorporado ao verbo pós-sintaticamente. Os diferentes contextos em que a marca aparece são resultantes da posição original que esse argumento ocupava: interno ou externo. A presença da variável na posição de argumento interno faz com que ela se ligue ao argumento externo, produzindo a interpretação reflexiva. Na posição de argumento externo, não havendo outro DP mais alto com o qual se ligar, ela não pode receber papel-θ ou Caso. Como resultado da ausência de papel-θ, a variável é lida como um expletivo em LF. A ausência de Caso é um problema para PF, onde é checado o filtro do Caso (LEVIN, 2015). Para que a derivação não seja perdida, a variável sofre incorporação ao domínio verbal, via Deslocamento Local, nos termos de Levin (2014, 2015). Essa configuração, em diferentes sabores de Voice (FOLLI & HARLEY, 2005), produz diferentes interpretações. A voz passiva e o domínio impessoal, tratados como um mesmo fenômeno, diferenciado apenas pela presença de um agente da passiva, resultam da incorporação da variável na posição de argumento externo de um VoiceDO. Por sua vez, a variável no especificador de um VoiceCAUSE gera os anticausativos. Nos contextos médios, ocorre a incorporação de uma variável na posição de argumento externo, enquanto o argumento de um núcleo Appl (PYLKKÄNEN, 2008) é promovido à posição de sujeito sintático. Verbos depoentes se dividem em três tipos: seguindo Alexiadou (2013), propõe-se que os agentivos são, em verdade, médios, e, por isso, são derivados da mesma maneira; os depoentes que envolvem sujeitos experienciadores projetam tal argumento via um núcleo EXP e têm a posição de argumento externo ocupada pela variável, que se incorpora; depoentes anticausativos são o resultado da incorporação do argumento de Appl numa estrutura sem Voice.