GERSTENBERGER, Debora. Gilberto Freyre: um teórico da globalização? História, Ciências, Saúde -Manguinhos, Rio de Janeiro. Disponível em: http://www. scielo.br/hcsm.
ResumoGilberto Freyre é um dos mais importantes intelectuais e cientistas sociais brasileiros de todos os tempos. No entanto, ao contrário de Fernand Braudel, o famoso contemporâneo francês e colega seu, Freyre atualmente não é considerado um fundador da nova 'história global'. A questão é: qual o valor da obra de Gilberto Freyre para a historiografia contemporânea? Já que a maioria de seus livros trata de temas como colonialismo, migração e a 'miscigenação' de diferentes etnias e culturas, será que também revela algo sobre o que chamamos hoje de globalização? Como historiadores, no âmbito da nova história global, podemos utilizar seus escritos para entender (melhor) o passado? E, se assim for, como podemos aproveitar sua obra? Palavras-chave: Gilberto Freyre (1900-1987; história global; teorias da globalização; metodologia ; Fernand Braudel (1902-1985. Keywords: Gilberto Freyre (1900-1987 global history; theories of globalization; methodology; Fernand Braudel (1902-1985.
Abstract
Debora Gerstenberger 2História, Ciências, Saúde -Manguinhos, Rio de Janeiro 2 História, Ciências, Saúde -Manguinhos, Rio de Janeiro Gilberto Freyre é, sem dúvida, um dos mais importantes intelectuais e cientistas sociais brasileiros de todos os tempos. O sociólogo Jessé de Souza (2000, p.69) o titulou como o "mais complexo", "difícil" e "contraditório" de todos os pensadores brasileiros. Uma das dificuldades que analisadores enfrentam ao tentar interpretar as obras de Freyre deriva da grande disparidade de seus temas e métodos, e, talvez, também da imensa quantidade de seus escritos, que consistem em não menos que sessenta monografias e ensaios copiosos. Para Peter Burke (1997), um dos seus mais conhecidos admiradores britânicos, o trabalho de Gilberto Freyre pode ser descrito como uma "forma de ecleticismo multidisciplinar, não propriamente síntese, mas sincretismo". Freyre, diz Burke, não somente propagava a "hibridização", mas também a praticou por toda sua vida intelectual (p.8). O próprio Gilberto Freyre enfatizava o pluralismo de seus métodos e de suas técnicas. Orgulhosamente combinava abordagens sociológicas, psicológicas, psicossociológicas, históricas, antropológicas, além de outras, para captar o que costumava chamar da "realidade" ou da "história" do "patriarcado brasileiro" (Freyre, 1977b, p.LXII).Como é bem conhecido, o quadro de análise preferido de Freyre sempre foi a entidade socioeconômica da casa. Muitos de seus estudos focalizam o microcosmo de habitações típicas brasileiras -por exemplo, o engenho açucareiro em Casa-grande e senzala (Freyre, 1933) e os sobrados e mucambos na obra subsequente Sobrados e mucambos (Freyre, 1936) -em que diversos grupos étnicos (africanos, afro-brasileiros, índios, portugueses) viveram juntos em espaços limitados. Conforme essa visão, a convivência nesse microcosmo habitacional favoreceu a 'miscigenação' ou 'mestiçage...