Aborto, valores religiosos e políticas públicas: a controvérsia sobre a interrupção voluntária da gravidez na audiência pública da ADPF 442 no Supremo Tribunal Federal

Abstract

Resumo: O artigo analisa a audiência pública da ADPF 442, ação no Supremo Tribunal Federal, que trata da interrupção voluntária da gravidez até 12 semanas como exemplo de controvérsia pública. Demonstra-se que a criminalização do aborto gera desigualdade em diversos níveis e afeta políticas públicas de atendimento à mulher. Valores religiosos, centrados no argumento da defesa da vida fetal, também foram acionados para a manutenção da lei como está, com emprego de argumentos da Ciência e do Direito. As argumentações e evidências apresentadas na ação por parte da maioria dos expositores/as levou em consideração a autonomia das mulheres como agentes morais em respeito à sua cidadania plena. Houve falas dos expositores/as antiaborto que anteciparam a postura anticiência concretizada no governo Bolsonaro.

aborto e a democracia no Brasil

“…As argumentações foram embasadas em pesquisas científicas provenientes de diversas áreas (Antropologia, Psicologia, Medicina etc) e fontes como SUS, Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e Pesquisa Nacional de Aborto. As exposições em tela se apoiaram também nos desafios enfrentados pelos profissionais dos serviços de saúde que têm o trabalho atravessado intensamente pela criminalização do aborto, além de problematizações provenientes de movimentos feministas (Luna & Porto, 2023).…”

“…Além da crença de que movimentos para descriminalização do aborto estariam ligados a uma tentativa de monitoramento populacional proveniente de organismos internacionais, a proposta da implementação de medidas que promovam o desencorajamento de gestantes à decisão de abortar, denominada como "Salve duas vidas" e o fomento de uma visão da defesa da manutenção da criminalização pela interrupção voluntária da gravidez como um ato de defesa da família, também fazem parte do rol a apelos repetitivos dos discursos contra a ADPF442 (Luna & Porto, 2023).…”

“…Débora Diniz, na ADPF 442, chamou a atenção para importância de considerar as práticas, em detrimento do que pode se configurar em um erro na elaboração metodológica nas pesquisas de opinião pública sobre o aborto. A antropóloga mostrou que tais inquéritos podem trazer números contrários à proposta de legalização, pois é inviável a coerência nas respostas quando a lei penal ameaça as entrevistadas, havendo uma expectativa moral à pergunta (Luna & Porto, 2023).…”