Resumo
A história do Islão e dos muçulmanos no Portugal contemporâneo está indelevelmente marcada pelas dinâmicas coloniais, mas também por processos pós-coloniais. As próprias configurações institucionais do “Islão público” na sociedade portuguesa revelam esta importância e, simultaneamente, criaram as condições para uma hierarquização de determinadas vozes e projectos entre os muçulmanos.
Partindo de três pesquisas sustentadas em trabalho de campo etnográfico sobre a Associação Islâmica e Cultural da Margem Sul, que representa a congregação afecta a uma mesquita de inspiração sufi no concelho de Almada, a Noor Fatima, um projecto caritativo encabeçado por uma mulher muçulmana de origem indo-moçambicana, e o Centro Islâmico do Bangladesh (CIB), envolvido no projecto da construção da nova praça da Mouraria, o objectivo deste artigo é demonstrar, por um lado, que esta hierarquia se sustenta em discursos dominantes sobre o Islão, que sublinham uma clivagem entre “muçulmanos portugueses” e “outros muçulmanos”, e, por outro lado, que existem margens que contestam esses discursos, revelando interessantes (des)articulações entre mobilidades, dinâmicas coloniais e pós-imperiais, políticas de reconhecimento e a produção de alteridades.