Alguns dizem que a escolha do estilo do sapato define a personalidade das pessoas. Outros defendem que, existe modelo, cor, textura para cada ocasião, época e lugar. O que tenho certeza, é que sou fascinada por eles. Tenho uma boa quantidade, mas gostaria de ter muito mais, ser uma centopeia para usá-los todos de uma só vez. Os sapatos despertam em mim, movimento, ação e fascínio. Instrumento para caminhar. Lembro-me desse gosto desde muito pequena, quando brincava com os sapatos de salto da minha madrinha. Ah, os de salto alto eram e são, até hoje, os meus favoritos. Um dia desses, arrumando meu armário, veio a minha cabeça a ideia de estabelecer um paralelo da minha vida, como pesquisadora e aluna de doutorado, com os meus sapatos, iniciei mentalmente e gostei, então decidi colocar no papel. Estava confortavelmente alojada em meus dois empregos e sem a mínima pretensão de voltar aos bancos escolares, como se estivesse caminhando de tênis, bem confortáveis, estáveis e seguros. Os tênis estavam acostumados com os meus pés, eram calçados com os cadarços já amarrados ficando devidamente ajustados. Após dez anos de mestrado, sem muita esperança em fazer um doutorado, inscrevi-me e deu certo. Foi como comprar um sapato novo, de couro, salto alto, lindíssimo. Estava dentro do doutorado. Fiquei cheia de satisfação, bem imponente e elegante pois, afinal, foi um processo seletivo exigente que passei, ao qual, uma pequena parcela da população de professores consegue chegar. A jornada para as aulas, viagens, seminários, infinitas leituras, trabalhos, pesquisas, indefinição de orientador, causaram-me calos nos pés, e o sapato novo começou a incomodar. Senti-me perdida e com uma imensa necessidade de reencontrar com as minhas ideias, experiências, crenças e verdades, pois o contato com teóricos e pesquisadores foi tão intenso que muitas vezes me senti confusa e sem identidade. Nesse momento, lembro-me de voltar ao meu armário e buscar algo para calçar, uma sandália mais confortável, já com a forma dos meus pés, para conseguir retomar a caminhada. Percebi que essa construção era única, ímpar e somente minha. Ela só teria sentido com a articulação dos conhecimentos já consolidados, com aqueles em processo de elaboração. Concluí os créditos das disciplinas, parti para a elaboração da pesquisa. Foram momentos solitários e muito difíceis, o aprofundamento em uma teoria totalmente nova para mim foi muito desafiante. Aqui, tenho a sensação de andar com sapatos de outras pessoas, de formato e números diferentes dos meus. O esforço de manter uma marcha com minha característica com calçados que não se adequavam aos meus pés foram etapas importantes para a elaboração de conhecimentos e desenvolvimento da pesquisa, e meu como um todo. Chego na qualificação insegura, porém, com a sensação de ter realizado um bom trabalho, mas, na avaliação final da banca, encontro vários pontos a serem adequados na pesquisa. Como se estivesse preparado um prato e misturado diferentes sabores, diversos ingredientes. É preciso retomar e redirecionar o trab...