Modernização caricata e acumulação capitalista na Amazônia: o caso da região de Carajás Novos Cadernos NAEA • v. 25 n. 4 • p. 11-34 • dez 2022 [...] marcadas tanto pelas continuidades quanto pelas mudanças, pois a paisagem natural também se transforma pela ação antrópica, seja pela corrupção e finitude dos elementos naturais, mas, sobretudo, decisivamente, pela dinâmica histórica como transformação de relações políticas, econômicas, sociais, culturais e tecnológicas. Assim, vejase a região como realidade histórica e geográfica em que movimento e transformação estão presentes nos dois termos da sentença (CUNHA; SIMÕES; PAULA, 2008, p. 494).
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MODERNIDADE CARICATA E COMPETITIVIDADE ESPÚRIANa região de Carajás, dentre as alterações derivadas das tentativas estratégicas de modernização, destaca-se a drástica e crescente urbanização. Em 1970, viviam nas cidades da região pouco mais de 27 mil pessoas; em 2021, estima-se que o número de habitantes já atinja um pouco mais de 1 milhão, o que representa uma taxa média de crescimento anual de 7,38% a.a. nesses 51 anos (Tabela 1).Não obstante, esse brusco movimento de urbanização realizou-se em acentuada oposição às propaladas ideias de que o prosseguimento da modernização importaria na racionalização crescente da organização da vida nas cidades, que seria progressivamente marcada pelo planejamento. Esse planejamento, por sua vez, resultante da aplicação dos métodos e das técnicas da ciência moderna e de suas descobertas, impulsionaria o desenvolvimento urbano.Lima e Rolim (2022), ao analisarem a dinâmica de urbanização na região de Carajás, demonstram que a situação vigente não corresponde ao ideário modernizante; pelo contrário, há uma clara subsunção das lógicas de ordenamento do espaço urbano a uma racionalidade intimamente atrelada à valorização mercantil do solo, esmaecendo sobremaneira as possibilidades de organização vinculadas ao planejamento urbano calcado em perspectivas urbanísticas que visam garantir o direito à cidade a todos os seus moradores. Esse direito é negado, já que as "condições precárias de acesso ao saneamento básico, especialmente o esgotamento sanitário, que, aliadas aos níveis reduzidos de renda, se tornam fontes importantes para a privação das famílias" (SILVA; MENDES; SOUSA, 2022, p. 243).Tanto a organização da vida urbana quanto a configuração do agrário mostram-se marcadas pela incompletude dos desdobramentos apregoados pelas diversas e sucessivas agendas atreladas à ideia de transformação por via de modernização. Cabe ressaltar que, no agrário, consolidaram-se trajetórias tecnoprodutivas que têm garantido ano a ano o elevado crescimento do valor da produção, sustentado, entretanto, pelo desmedido aumento da adubação química, do uso de agrotóxicos e de combustíveis fósseis. Nesse cenário, as oportunidades de desenvolvimento futuro da economia agrária encontram-se fortemente condicionadas a mecanismos d...