“…44 Nazarbayev vangloria, em seus textos doutrinários que citamos mais acima, as relações de gênero no Cazaquistão, mais simétricas do que nos países vizinhos da Ásia Central, nos quais o dogmatismo islâmico tem se radicalizado nos últimos anos e redefinido os papéis de gênero em detrimento das liberdades individuais das mulheres. As relações de gênero no Cazaquistão ainda em muito são pautadas pelas antigas doutrinas soviéticas voltadas para a transformação das mulheres e dos homens em trabalhadores, com pouca distinção de gênero (Edmondson 1992;Fathi 2011), 45 embora perceba-se que a assimetria de gênero arrolada em padrões considerados como heteronormativos oriundos da sociedade rural "tradicional" tem consequências bastante nefastas, como se pode notar, por exemplo, através de uma história em quadrinhos que fez sucesso recentemente ao apresentar um herói no combate ao chamado "comportamento indecente" da mulher, 46 além de pesquisas realizadas sobre o assunto, denunciando as mazelas da dominação masculina 47 (Cleuziou & Direnberger 2016;Rani & Bonu 2009). Oficialmente, o país talvez prefira de fato manter a ambiguidade também aqui para evitar a desestabilização da estrutura ideológica que mantém a ideia de que a nação cazaque é cazaquistana, voltada para os princípios da igualdade cidadã entre homens e mulheres; mas, ao mesmo tempo, ainda associada aos valores rurais e nômades, "tradicionais" (Megoran 1999;Snajdr 2007) -assim, reproduzir-se-ia uma espécie do que poderíamos propor em chamar aqui, por ora, de "hetero-etno-nacionalismo"... cívico!…”