O caráter comercial preponderante nas farmácias e drogarias no Brasil encobre uma questão que deveria ser óbvia: a natureza de estabelecimentos "de interesse para a saúde", conforme a classificação dos órgãos reguladores. Motivo suficiente para que fossem lugares de esforços etnográficos de pesquisas no campo das ciências sociais e humanas em saúde, no intuito de compreender as dinâmicas internas, as relações que ali se estabelecem, valores e representações que fazem parte desses espaços de presença tão massiva no Brasil e estratégicos quando pensamos a dispensação e circulação de medicamentos.No entanto, não se trata de um espaço de pesquisa comum, tampouco fácil de ser etnografado. Em termos gerais, parece-me pairar certa desconfiança sobre espaços, profissões e indústrias que produzem e colocam em circulação medicamentos, justamente por sua importância para a saúde da população, que vê nesses insumos uma forma central de acesso à saúde. Desconfia-se da indústria farmacêutica e de sua relação com os profissionais que prescrevem medicamentos; também da dinâmica entre essa indústria e os espaços comerciais onde coloca os fármacos em circulação; e mesmo da relação entre prescritores e estabelecimentos comerciais. Nessa trama, alguns profissionais são menos conhecidos, pela população em geral e dentro da academia, em termos de práticas e representações. Entre eles estariam, sem dúvida, os que atuam em farmácias (farmacêuticos, balconistas, representantes farmacêuticos etc.), cujas dinâmicas e interações parecem invisíveis em um fluxo no qual médicos, pacientes e medicamentos seriam agentes centrais e os outros, mediadores.