Resumo: A construção de valores é vista como um processo intensamente dinâmico envolvendo internalização e externalização de significados coletivos, além de ser fundamental para a construção de uma síntese pessoal. O presente artigo parte da Psicologia Cultural e da Teoria do Self-Dialógico e propõe que a "responsabilidade" pode ser entendida como um valor, como um campo afetivo semiótico carregado de sentidos. Um estudo de caso ilustra como uma jovem (Jane) navega na cultura coletiva e constrói um novo significado pessoal de si mesma como uma "pessoa responsável". O valor da "responsabilidade" vai sendo integrado ao sistema pessoal de valores da jovem através de continuidades e mudanças nos seus posicionamentos ao longo do tempo e em diferentes espaços, especificamente a família, o trabalho e a religião. Os resultados mostram a dinâmica dos posicionamentos e o surgimento de novas perspectivas para o futuro.Palavras-chave: responsabilidade, valores, transição para a vida adulta, Teoria do Self Dialógico.* Endereço para correspondência: e.mattos2@gmail.com Este artigo explora a centralidade da mediação semiótica na experiência dos jovens, focalizando o movimento por meio do qual eles reconfiguram sua cultura pessoal, seu sentido de si mesmo, e constroem e consolidam um sistema de valores capaz de organizar suas relações com o contexto e, também, direcionar suas ações futuras (Zittoun, 2006;Branco & Valsiner, 2012). Este artigo consta de três partes. Na primeira, buscaremos desenvolver desde a perspectiva da Psicologia Cultural do Desenvolvimento, uma compreensão dos processos de autorregulação semiótica--dialógica, ressaltando sua natureza fundamental para o desenvolvimento humano e também para a construção dos valores -tais como a "responsabilidade" -, que sustentam a experiência da pessoa ao longo da vida. A segunda parte apresenta um estudo de caso que ilustra como a jovem Jane -ao longo do período que vai dos 16 aos 23 anos de idade -negocia sentidos relevantes em torno da questão da "responsabilidade", que passa a constituir um valor central na orientação de suas ações e de sua trajetória de vida. A terceira parte trata da dinâmica dos processos que estão envolvidos na autorregulação levando à construção hierár-quica de valores que orientam a trajetória de vida da jovem.
Uma perspectiva semiótica-dialógica da construção dos valoresConforme sugerem Branco e Valsiner (2012), os valore não estão na cultura, eles são a cultura, i.e. a cultura se constitui fundamentalmente a partir de valores. Eles estão em toda parte, mas é difícil nomeá-los e localizá-los com precisão. No entanto, eles ganham relevância quando entram em operação. Isso ocorre porque os valores são signos hipergeneralizados que orientam a conduta humana e localizam-se no nível mais alto da hierarquia de regulação semiótica (Branco & Valsiner, 2012). Os valores podem ser considerados como crenças carregadas de afeto, associadas com propósitos ou com uma orientação para objetivos (Branco & Madureira, 2008). Branco (2012) ressalta que tal concepção ...