Revista BRasileiRa de Política inteRnacional temas e Regiões nas Políticas exteRnas de lula e FeRnando HenRiqueUma das evidências da adoção desse tipo de diplomacia pelos dois presidentes pode ser percebida a partir do número de viagens que fizeram para o exterior, razoavelmente maior do que o de seus antecessores. Segundo o Jornal Folha de São Paulo, de 4 de dezembro de 2010, Lula e Fernando Henrique gastaram nada menos que 16% e 12%, respectivamente, de seus mandatos no exterior. Já os números para Itamar, Sarney e Collor foram: 5%, 8% e 10%, respectivamente.O período analisado é singular também porque nos fornece a oportunidade de avaliar dois presidentes cujos partidos apresentam perfis ideológicos/programáticos bem distintos e que ficaram no poder pelo mesmo período de tempo. A distância ideológica entre eles nos permite avaliar as influências da política doméstica sobre a política externa e vice-versa (Gourevitch 2002), já que o presidente e o seu partido precisam diferenciar-se também na arena internacional, ao mesmo tempo em que estão limitados pelo contexto interno. O Partido dos Trabalhadores (PT) fez isso muito claramente desde a sua criação, funcionando como uma âncora do sistema político, centralizando simpatia e rejeição (Rennó e Cabello 2010). Ele diferenciouse em vários aspectos: disciplina no Congresso Nacional, preferência dos eleitores, composição social dos seus integrantes, retenção/migração dos seus membros (Carreirão e Kinzo 2004; Figueiredo e Limongi 1999;Melo 2004;Rodrigues 2002;Samuels 2004). Existe uma ampla literatura sobre isso e não cabe rediscutila neste texto; nosso objetivo aqui limita-se à avaliação dos pronunciamentos dos dois últimos presidentes quando atuando na arena internacional, considerando principalmente essa referência partidária. A expectativa é que a política externa do PT seja substancialmente diferente daquela adotada pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), pelo menos no que diz respeito ao discurso.Pretendemos dar duas contribuições principais. A primeira é colaborar para a discussão da política externa brasileira nas últimas duas décadas. Há muitas pesquisas a respeito desse período, mas ainda existe muita controvérsia na literatura, não raramente, eivada de subjetivismo.A segunda contribuição é de natureza metodológica. Pretendemos aplicar o método da análise de conteúdo (AC) à disciplina de relações internacionais. Nos Estados Unidos ele é usado há bastante tempo nos estudos da área -veja os trabalhos importantes de Russel e Wright (1933), Laswell (1941), e Pool (1952. No Brasil, a sua aplicação é quase inexistente, apesar de os especialistas na área recorrerem com frequência ao pronunciamento de autoridades e instituições oficiais. Em uma avaliação exploratória de 177 artigos publicados na Revista Brasileira de Política Internacional (RBPI) nos últimos dez anos, verificamos que 69 (39%) deles faziam referência direta, em maior ou menor escala, a documentos oficiais ou à manifestação de autoridades governamentais, empresários e outros atores estata...