ResumoEnquanto conceito, a lusofonia é hoje olhada com justificada desconfiança por muitos lusófonos. Sendo impossível desligar esse conceito do lastro colonial que liga os países que têm o Português como língua oficial, importa, no entanto, não encerrar o debate nesse plano. Neste trabalho revisitamos algumas das narrativas fundacionais de uma identidade mitificada, como são as diferentes assombrações de um prometido Quinto Império ou o lusotropicalismo, tanto na sua fundação no Brasil quanto na sua reconstituição em Portugal. Por outro lado, procuramos pensar a lusofonia a partir da sua matriz formal: uma língua partilhada por diferentes povos em diferentes continentes. Também neste ponto o nosso objetivo é problematizar e densificar o debate, convocando para tal uma experiência singular de reflexão, concretamente a que é elaborada por Jorge de Sena já na reta final do Estado Novo. Partindo dessas focalizações, argumentamos sobre a possibilidade de a lusofonia comportar linhas de fuga a um certo reducionismo crítico, nomeadamente as que decorrem da circulação, convergente e divergente, de narrativas e de experiências singulares. Esta circulação de pessoas, ideias e memórias é potencialmente definidora de um espaço difuso e policentrado de efetiva interculturalidade sobre o qual importa refletir.
Palavras-chaveLusofonia; cultura; interculturalidade; excecionalismo; singularidade
Flows, transits and (dis)connection points: contributions towards a critical Lusophony AbstractAs a concept, Lusophony is today looked upon with justified suspicion by many Portuguese-speaking people. It is impossible to separate this concept from the colonial ballast that bounds the countries that have Portuguese as the official language. However, it is important to not end the debate on this plane. In this work we revisit some of the foundational narratives of a mythical identity, such as the different hauntings of a promised Quinto Império or Lusotropicalism, both in its founding in Brazil and in its reconstitution in Portugal. On the other hand, we discuss about Lusophony from its formal matrix: a language shared by different peoples in different continents. Our objective is to problematize and deepen the debate, summoning a unique experience of reflection, concretely the one that is elaborated by Jorge de Sena already in the final stretch of Estado Novo. Based on these focuses, we argue about the possibility of Lusophony to include lines of escape from certain reductionisms, namely those that derive from the convergent and divergent circulation of narratives and singular experiences. This circulation of people, ideas and memories, is potentially defining a diffuse and polycentric space of effective interculturality, which nurtures further reflection.