O artigo revisita a história dos movimentos sociais de bairros de Fortaleza (CE), tendo como referente empírico o Conjunto Palmeiras, cuja formação territorial remete aos anos 1970. A análise resulta de aproximações etnográficas que adentram no cenário da mobilização por direitos fundamentais e pela urbanização do bairro, espaço social que resguarda uma memória de lutas e conquistas, possibilitando identificar agentes envolvidos na projeção desses movimentos nas décadas de 1980 e 1990. Essa experiência de organização coletiva segue na formação de espaços de autonomia, com momentos de interlocução e resistência frente ao Estado, trazendo contribuições para o debate acerca de temas como movimentos sociais, soberania e representação popular.Palavras-chave: Política. Movimentos sociais. Representação. Soberania. Cidade.
INTRODUÇÃOO Conjunto Palmeiras resguarda uma memória de lutas e conquistas através da qual é possível identificar agentes envolvidos na projeção dos movimentos sociais de Fortaleza nas décadas de 1980 e 1990. Este artigo adentra na singularidade desse espaço urbano, onde se desenvolveram iniciativas dos moradores pelo acesso a direitos fundamentais, culminando na formatação de metodologias de ação e tecnologias sociais no final dos anos 1990. No cenário atual, a organização coletiva no bairro não perdeu de vista as ações reivindicatórias, assumindo a formação de Conselhos de Quarteirão -nova dinâmica da organização local -, como espaços de autonomia e reflexão sobre soberania popular, pondo em cena diálogos possíveis, mas também a resistência frente ao Estado.A história dos movimentos sociais em Fortaleza se desenrola num contexto plural de experiências nas diversas regiões da cidade, assinaladas por contornos que revelam aspectos comuns, não obstante as particularidades de cada bairro. Em relação aos determinantes socioculturais e políticos comuns aos diferentes processos organizativos, importa assinalar que a dinâmica da formação de favelas e bairros empobrecidos em Fortaleza resulta, em parte, das migrações internas ocorridas no Ceará, fenômeno marcado pelo êxodo rural impulsionado pelas condições climáticas de um ambiente semiárido, associado à ausência, precariedade ou insuficiência de políticas públicas capazes de manter as famílias de agricultores no interior do estado.A "modernização" e o crescimento da Região Metropolitana de Fortaleza, notadamente a partir dos anos 1980, potencializaram também a atração de indivíduos e famílias que buscavam serviços indisponíveis ou de difícil acesso nos municípios interioranos. Acelerou-se a especulação imobiliária de terras urbanas, desencadeando a expulsão de moradores de áreas de interesse para a construção civil com ampliação da rede hoteleira e do parque industrial, abertura de ruas e avenidas, criação de shoppings centers, gentrificação de espaços, dentre outros efeitos.