O artigo reflete sobre a utilidade da semântica do risco para a compreensão do contexto pandêmico da COVID-19. Discute a teoria da sociedade de risco desenvolvida por BECK e complementada por GIDDENS, buscando salientar como as metamorfoses da natureza dos riscos, desvelam como traços fortes da contemporaneidade não só o aumento profuso dos riscos induzidos pela tecnociência (gerados socialmente), mas também, em consequência dos efeitos secundários incontrolados e imprevistos desse processo, a proliferação de uma incerteza ubíqua que, concomitantemente, coloca em causa a noção de risco enquanto algo objetivamente calculável e gera um estado de ansiedade e vigilância perpétuos. Partindo do binómio liberdade vs. segurança, tecemos algumas considerações sobre o modo como: (i) a ação humana, no mesmo processo em que buscou tornar os medos menos assustadores, acabou por produzir perigos mais ubíquos de que o SARS-CoV-2 pode, quiçá, ser considerado um exemplo; (ii) a maior ou menor confiança depositada na ciência, nos sistemas periciais, políticos, tende a influenciar as representações dos indivíduos relativamente à sua capacidade de lidar com os perigos associados à COVID-19; (iii) as perspectivas construtivista/sociocultural vs. objetiva/realista do risco podem revelar a sua utilidade na compreensão das distintas atitudes comportamentais (prudentes vs. incautas) ante os riscos e as medidas que, paulatinamente, têm sido adotadas para os combater. A análise permite concluir que o SARS-CoV-2 consubstancia um perfil de risco típico da modernidade tardia, e evidencia as influências da problematização das questões da segurança/liberdade e da percepção dos riscos na ação/reação dos indivíduos no contexto estudado.