Este artigo, escrito em formato ensaístico, examina um recorte específico da obra do historiador português Alexandre Herculano (1810-1877). Reconhecido por sua importância indelével para a historiografia portuguesa produzida no século XIX, tendo atuado, ainda, como jornalista, literato e gestor público, este importante homem de letras surpreendeu o clero de seu país ao publicar, em 1846, o primeiro volume de sua Historia de Portugal. Ao reconstituir o passado histórico que ajudaria a explicar as origens nacionais, após as guerras liberais de 1832-34, Herculano assentou um corte entre a tradição fundadora, associada à crença na aparição de Cristo ao príncipe Afonso Henriques, e sua impossível comprovação histórica e documental. Portanto, o objetivo geral deste estudo é problematizar as implicações éticas assumidas pelo historiador português ao estabelecer diferentes cortes discursivos em seu trabalho com o passado, em particular, no que se refere ao mito de origem católico e os problemas demarcados no presente português oitocentista, que a história, como produto da busca pela verdade, deveria também auxiliar a resolver. Em termos teóricos, o artigo apresenta possibilidades analíticas e resultados amparados nos debates da área de história da historiografia, especialmente, no que diz respeito ao estudo da ética para historiadores em diferentes temporalidades.