Desde os anos setenta do século passado, os estudos de mulher e de gênero trouxeram para o campo da historiografia ocidental, além das inúmeras provas das contribuições das mulheres para a cultura obliteradas ou distorcidas pela historiografia oficial, uma visão bem completa das estratégias de exclusão, apropriação, distorção e perseguição desse matrimônio, com o objetivo de perpetuar e justificar a visão do patrimônio cultural como superior, único e (quase) exclusivamente masculino. Repensar as funções e os funcionamentos altamente politizados que tiveram nos séculos XIX e XX as historias das literaturas nacionais e os seus cânones a partir do conceito de matrimônio abre o caminho para uma nova historiografia da cultura ocidental. Resgatar a imensa riqueza dos matrimônios locais e regionais da Europa medieval, bem como detectar as suas raízes, sua continuidade e permanência ao longo dos séculos, permitirão re-descobrir o outro Mundo, o outro projeto histórico que mulheres e seus aliados masculinos instauraram no mundo indo-europeu e continuam defendendo até hoje contra um patriarcado violento e hegemônico.