O estrangeiro que chega à aldeia Jarawara pela primeira vez 1 -em meio à curiosidade que marca encontros como este, o alívio por descansar após a longa e desconfortável caminhada e a alegria de encontrar uma aldeia tão bonita -ouve na fala discreta das pessoas o vocábulo amosákê 2 marcando o desfecho de toda conversa. Trata-se de um verbo, namosá/amosá (a depender da oração), que abrange uma série de ideias referentes aos feitos que deixam algo ou alguém mais bonito: renovar, limpar, refazer, consertar, transformar. Bonito não apenas em termos de beleza, mas também no sentido de "certo", "bom", "boa", "bem feito", "renovado", "do jeito que deve ser".Há uma grande preocupação das pessoas em deixar tudo à sua volta "bonito" e "certo" (amosákê). De forma a ilustrar esta ideia, lembro que as casas devem ter seus arredores capinados, retiram-se periodicamente as ervas daninhas dos roçados, e a aldeia está sempre asseada, marcando de maneira contrastante sua diferença com a floresta -tal como podemos encontrar em outros povos ameríndios como, por exemplo, os Piaroa (Overing 1999). As pessoas se visitam apenas quando estão limpas e perfumadas -e só assim aceitam posar para fotos. As uniões matrimoniais devem ser "certas", com os cônjuges apropriados. A comida deve ser gostosa e nutritiva. Os filhos devem obedecer aos pais. Tudo deve ser novo: as madeiras das casas, os barcos, as roupas, as pessoas. Quase como se o namosá exagerasse um ideal do "viver bem" (Gow 1997); uma estética jarawara da produção do novo… do belo, do certo.O namosá mobiliza referências, afetos, sentimentos, remetendo a um conjunto de conceitos que discutirei ao longo deste ensaio, como "gostar"/"seduzir" (nofá), "cuidar" (narifá) e "criar" (nayaná). São ideias centrais da socialidade jarawara, que não se limitam às relações entre humanos, mas se estendem como formas de experiência a praticamente todos os tipos de seres do cosmos, particularmente às plantas.O que me proponho a discutir aqui, se bem me lembro, foi despertado quando um de meus amigos, Wero, me contou uma história que ouvira em