Nas clássicas teorias acerca dos Direitos Humanos, esses são pensados como decorrentes de uma certa “natureza humana”, no sentido de que tais direitos se depreenderiam imediatamente de uma dignidade fundante da categoria do “humano”. Tal afirmação simplória, no entanto, se coloca em paradoxo com a imensa dificuldade de garantia de direitos humanos à coletividades inteiras, especialmente quando estão em operação formas excludentes de compreensão do humano, ligadas a nacionalismos, racializações, ou a experiências de gênero e sexualidade compreendidas como “desviantes”. Nessas últimas, o paradoxo da natureza humana mostra-se em sua crueza, tendo em vista que as vivências de grupos LGBTI+ foram historicamente identificadas como “não naturais”. As demandas por direitos de pessoas LGBTI+, assim, vêm acompanhadas no contexto mundial de uma demanda por integrar a categoria do humano, inclusive apelando-se, em alguns casos, para compreensões bio-ontológicas da definição da sexualidade humana como argumento chave. Tal postura possui o evidente objetivo de naturalizar a experiência LGBTI+, disputando assim quais experiências corpóreas e sexuais a categoria do humano pode “naturalmente” conter. Com o objetivo de explorar e questionar a realidade narrada e através de uma metodologia de fundo ensaísta, este artigo demonstra que tal movimento mostra um paradoxo: ao passo que o fundamento na natureza humana é com frequência colocado como uma forma de proteger os direitos de tendências excludentes e reducionistas, ele é em si mesmo excludente, no sentido de que a “natureza humana” não possui um sentido ontológico único a ser descoberto, mas é ela mesma socialmente definida. Ao desenvolver essa problemática, este trabalho procura dialogar com perspectivas da filosofia contemporânea e especialmente com a obra de Judith Butler, a qual nos mostra que toda ontologia, em especial aquela relacionada às identidades sexuais e de gênero, é histórica. Assim é também a “natureza humana”, sendo necessário questionar os sentidos que esta ocupa como fundamento dos direitos humanos. À guisa de conclusão, propõe-se pensar os direitos humanos a partir de fundamentos contingentes, no sentido trazido por Butler, que para cumprirem seu papel de expansão de formas vivíveis de vida, devem permanecer sempre abertos à contestação e à ampliação de suas fronteiras, incluindo novas experiências humanas.