Neste artigo, proponho a compreensão da violência linguística praticada contra pessoas trans enquanto instância do dispositivo de colonialidade de gênero vigente na sociedade brasileira. Para tanto, orientado por perspectivas pragmáticas e socioantropológicas da linguagem acerca das noções de performatividade, violência linguística, indexicalidade e entextualização, articulo construtos teóricos sobre as problemáticas da colonialidade/decolonização do mundo ocidental eurocentrado com as discussões sobre performances de gênero, vivências trans e transfobia, informadas por perspectivas queer/cuir/transviadas dos estudos das dissidências sexuais e de gênero. Do ponto de vista analítico, discuto dados gerados em uma pesquisa de cunho etnográfico virtual,realizada entre junho de 2015 e junho de 2016, na seção de comentários online do site de notícias brasileiro G1, a partir de interações acerca de matérias que tematizam a crucificação encenada pela atriz e modelo transexual Viviany Beleboni, durante a 19ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, ocorrida em 2015. Ao cabo do trabalho, argumento, grosso modo, que o dispositivo da colonialidade de gênero assenta seu horizonte simbólico em marcos de reconhecimento que significam como violentáveis, matáveis e disciplinarmente puníveis sujeitos cujas performances de gênero estão em desacordo com ontologias coloniais fundadas na alegada coerência compulsória entre sexo, gênero e desejo.
Este artigo tem como objetivo refletir, mediante um trabalho teórico-analítico, acerca de práticas linguísticas digitalmente mediadas, engajadas na produção de violência linguística contra pessoas transexuais, travestis e transgêneras. Para este fim, alinhando-nos às perspectivas da Nova Pragmática Linguística, especialmente aos desenvolvimentos recentes em torno da Teoria dos Atos de Fala, problematizamos a compreensão clássica acerca da cooperação como regra das interações linguísticas, destacando o particular caráter violento que algumas delas podem assumir, enquanto efeito pragmático produzido pela natureza indexical dos atos de fala. Ademais, salientamos as especificidades das práticas linguísticas realizadas no ciberespaço, atinentes ao potencial semiótico da violência nesse contexto. Assim, aplicando as discussões teóricas empreendidas, à luz de uma metodologia qualitativa e de cariz interpretativista, procedemos à análise de dois comentários online postados por leitores na página de notícias G1, em matérias relativas a 19º Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, Brasil, ocorrida em 2015. Ao cabo do trabalho, constatamos a produtividade da perspectiva pragmática sobre a linguagem na compreensão de práticas online nas quais esta é utilizada com vistas a ferir pessoas contextualmente posicionadas em lugares subalternos em termos de gênero, a exemplo de pessoas trans, dentre outros marcadores sociais da diferença.
RESUMO Este artigo tem como objetivo construir inteligibilidades contingentes acerca de eventos interacionais marcados pela violência linguística praticada contra pessoas trans, a partir da análise de atos de fala em circulação em comentários online. Nesse sentido, discuto os resultados de uma pesquisa qualitativa, inspirada na etnografia virtual, feita entre julho de 2015 e julho de 2016, na seção de comentários do site de notícias brasileiro G1, em três matérias jornalísticas relacionadas à encenação de uma crucificação realizada pela atriz e modelo transexual Viviany Beleboni, durante a 19ª edição da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo. Do ponto de vista teórico, são mobilizados saberes relativos à noção de linguagem como performance, às discussões sobre a violência linguística e ao processo de patologização das vidas trans. No trabalho analítico empreendido, foram focalizados os processos de entextualização acionados pelos participantes em seus comentários online. Assim, em razão do olhar adotado sobre os dados gerados, o que se observa é a produção de uma (meta)pragmática engajada no reestabelecimento de contextos violentos, relativos a discursos médico-científicos patologizantes, com vistas a dotar de força ilocucionária os atos de fala transfóbicos, capazes de subalternizar e ferir pessoas trans por meio da linguagem. Desse modo, a pesquisa realizada permitiu salientar o potencial de um modelo indisciplinar e descentrado de investigação em linguagem, comprometido com a compreensão de práticas semióticas situadas na elaboração da realidade social, particularmente em tempos de alta reflexividade e trânsitos textuais intensos.
Este artigo tem como objetivo apresentar uma proposta de interpretação não-dicotômica para o modo como normas macrossociais, notadamente a cis-heteronormatividade, estão atrelados a micronormatividades, construídas entre sujeitos, nas interações situadas de que participam. Para isso, articulando noções de materialização discursiva e de escala, destaco o caráter processual do trabalho pragmático e semiótico em jogo nos processos locais de naturalização da cis-heteronormatividade. A partir da análise de dados de interações online, gerados numa etnografia da escala, demonstro como os traços discursivos da cisnormatividade, conforme postulados por epistemologias transfeministas (binariedade, pré-discursividade e permanência), são perspectivados em constante fricção com conteúdos ideológicos da heteronormatividade. Por fim, recorrendo a tensionamentos contemporâneos no campo das Teorias Queer brasileiras, reflito sobre políticas de afetação, de tradução e de deslocamento que podem inspirar novas imaginações à Linguística Queer no Brasil.
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